Bruno Goulart
O PT e o governo federal têm apostado em três frentes no Congresso para construir uma agenda positiva capaz de fortalecer a imagem do presidente Luiz Inácio Lula da Silva até 2026: a isenção do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil, a Medida Provisória da taxação de apostas e aplicações financeiras e o pacote de projetos de segurança pública. A estratégia é transformar cada votação em vitrine política após a rejeição da chamada “PEC da Blindagem”, que expôs fragilidades da oposição e abriu espaço para o Planalto avançar no Legislativo.
A advogada internacionalista Melissa Borges avalia ao O HOJE que o PT soube aproveitar o momento. “O partido vai usar os projetos de interesse do governo no Congresso, aproveitando a baixa que teve a PEC da Bandidagem, como ficou conhecida, que afetou profundamente a imagem dos políticos de direita no Brasil”, afirmou.
Segundo Melissa, o impacto foi tão grande que parlamentares correram para justificar seus votos. “Isso deu margem para o PT acelerar sua própria pauta e tentar consolidar ganhos de imagem”, completou, ao citar o exemplo da deputada federal Silvye Alves (UB), que disse ter sofrido pressão do partido para dar voto favorável à “PEC da Blindagem”, que a esquerda apelidou de “PEC da Bandidagem”.
Pautas
O primeiro desafio é a votação da isenção do Imposto de Renda para salários de até R$ 5 mil, em discussão na noite desta quarta-feira (1°) na Câmara. Eram quase 23h, quando o presidente Hugo Motta (Republicanos-PB) divulgou o resultado: 493 votos a favor, por unanimidade. O impacto estimado é de R$ 25,8 bilhões por ano, que deverá ser compensado por uma maior tributação sobre rendas acima de R$ 600 mil anuais — aproximadamente 0,13% dos contribuintes.
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A medida tem foco direto na classe média, considerada estratégica para 2026. No entanto, a aprovação enfrenta obstáculos: líderes do PL já sinalizaram que vão cobrar cortes em áreas como saúde e educação como condição para liberar a pauta. “Vejo que haverá muita negociação e atrito para que isso passe. Não será tarefa fácil”, ressaltou Borges.
Outra peça central é a Medida Provisória da Taxação, que precisa ser votada até a próxima quarta-feira (8) para não perder validade. A MP amplia impostos sobre apostas esportivas on-line (bets), cria tributação sobre ganhos hoje isentos e prevê medidas de contenção de gastos. O relator, deputado Carlos Zarattini (PT-SP), calcula arrecadação de até R$ 20 bilhões e economia de R$ 15 bilhões, num impacto fiscal total de R$ 35 bilhões. Para o governo, além de aliviar o caixa, a medida serve para reforçar a narrativa de justiça tributária – um dos motes mais repetidos por Lula desde o início do terceiro mandato.
Já a pauta da segurança pública foi priorizada após acordo do presidente da Câmara, Hugo Motta, com os 27 secretários estaduais da área. O pacote inclui aumento de pena para homicídios contra policiais e endurecimento contra organizações criminosas. Ao abraçar o tema, tradicionalmente associado à direita, o PT tenta neutralizar críticas sobre “leniência com o crime” e conquistar parte do eleitorado mais conservador.
Dialogar com a vida dos brasileiros
Para o cientista político Lehninger Mota, as três frentes se complementam no objetivo de melhorar a percepção do governo em diferentes segmentos. “O governo sabe que apenas o discurso internacional não é suficiente. Agora precisa de pautas que dialoguem com a vida real dos brasileiros. A isenção do IR fala com a classe média, a queda da inflação beneficia os mais pobres e a agenda de segurança pública busca mostrar firmeza diante da criminalidade”, disse.
Mota acrescenta que o PT tenta aproveitar a mudança de cenário. “O governo saiu das cordas e agora parte para o ataque. Se conseguir aprovar essas medidas, mostra preocupação concreta com a classe média e reforça sua base popular. Isso é o que pode colocá-lo em melhores condições para 2026”, concluiu. (Especial para O HOJE)