Fios soltos, caídos no chão ou pendurados de forma desordenada nas ruas de Goiás, tornaram-se uma ameaça real e constante para a população. A tragédia recente que vitimou a adolescente Nathály Rodrigues do Nascimento, de apenas 17 anos, no Centro de Goiânia, reforça a gravidade do problema e acende o alerta para a urgência de soluções efetivas.
Na tarde da terça-feira (23), enquanto um temporal forte atingia a Capital, a jovem atravessava a Rua 20 quando, sem perceber pisou em um fio de alta tensão que havia se rompido e caído no chão. A eletricidade percorreu o corpo, provocando uma descarga fatal. Segundo o Corpo de Bombeiros, que chegou rapidamente ao local, Nathály já estava inconsciente, em contato direto com a fiação energizada. O Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU) confirmou o óbito ainda no local.
“É uma tragédia sem tamanho que abala toda a administração municipal. Nathály era uma jovem cheia de sonhos e possibilidades, e essa perda precoce nos faz redobrar o empenho em ações preventivas”, afirmou Sandro Mabel, em nota de pesar divulgada após o acidente.
Dias antes do ocorrido, em 19 de setembro, a Prefeitura de Goiânia realizou uma importante reunião, em parceria com o Ministério Público de Goiás (MP-GO) e a concessionária Equatorial Goiás, para discutir a retomada e reformulação do projeto de ordenamento e retirada dos fios soltos nos postes da cidade.
O encontro teve a participação do procurador-geral de Justiça, Cyro Terra, que elogiou a iniciativa de Mabel, que destacou o problema dos fios soltos como um risco significativo para pedestres, ciclistas e motociclistas, além de provocar poluição visual e prejudicar a qualidade de vida da população.
Na reunião, também foi reforçado o papel das operadoras de telecomunicações, obrigadas pela Lei nº 9.785, de 2016, a manterem os fios organizados e em bom estado. A responsabilidade pela retirada correta e manutenção da fiação recai sobre essas empresas, que precisam atuar em conjunto com a concessionária de energia e com os órgãos municipais para garantir a segurança nas vias públicas.
O presidente da distribuidora de energia, Lener Jayme, destacou o compromisso da empresa em colaborar com as autoridades para enfrentar esse desafio. “Seguimos firmes e compromissados com a resolução deste complexo problema urbanístico e ambiental, em parceria com o Ministério Público e a Prefeitura de Goiânia”, afirmou.
Infelizmente, o caso de Nathály não é isolado. Em Anápolis, no dia 19 de setembro, um menino de 10 anos morreu eletrocutado após encostar em um fio de telefonia que estava solto e energizado na Rua Noêmia, no Setor Vila Jussara. As equipes de resgate foram acionadas, mas não conseguiram salvar a criança, que já estava sem vida no local.
Esses episódios evidenciam que o perigo não está apenas nos temporais, mas na falta de organização, fiscalização e manutenção adequada da fiação aérea espalhada pelas cidades. A desordem cria um cenário onde a queda de cabos energizados no chão é uma ameaça constante para qualquer pessoa.
“O problema dos fios soltos é complexo e envolve aspectos técnicos, legais e administrativos”, explica o advogado especialista em Direito Público e Administrativo, Daniel Assunção. “Não existe uma legislação nacional específica que regulamente a organização estética e estrutural da fiação elétrica e de telecomunicações nas vias públicas, embora haja um projeto de lei em discussão para tornar obrigatório o aterramento da fiação em todo o Brasil.”
O especialista reforça que a responsabilidade pela organização e segurança da fiação é das concessionárias e empresas de telecomunicações, mas os municípios também respondem judicialmente por danos causados à população.
Em Goiânia, o tema ganhou destaque na Câmara Municipal. Em julho, a Comissão de Direitos do Consumidor realizou audiência pública para discutir os riscos associados à “malha caótica” de fios de energia, telefonia e internet, que causam riscos reais de acidentes, incêndios e quedas de postes.
O vereador Coronel Urzêda (PL), presidente da comissão, alertou que “o excesso de fios soltos e mal organizados traz riscos sérios a pedestres e motoristas”. O vereador Cabo Senna (PRD) destacou a importância de responsabilizar as empresas pela manutenção e retirada dos cabos inativos, enquanto o vereador Sanches da Federal (PP) também participou do debate.
Além disso, representantes das principais empresas de telefonia, como Vivo e Tim, apontaram dificuldades enfrentadas, como vandalismo e uso irregular de postes por empresas clandestinas, que agravam a situação. Segundo a representante da Tim, Fabiana Arruda, “a fiscalização da fiação é responsabilidade da concessionária de energia, a Equatorial, que deve assegurar a organização dos cabos”.
A Prefeitura de Anápolis, devido ao caso, decretou situação de emergência para remoção imediata de fios soltos, pendentes ou sem identificação. Até o momento, mais de 300 autos de infração foram lavrados, cada um com multas de até R$ 20 mil para as empresas responsáveis.
O jornal O HOJE entrou em contato com a Equatorial, que lamentou a morte da adolescente, mas não informou se possui alguma ação ou programa específico para identificar e corrigir fios soltos ou com risco de acidentes em áreas urbanas.
Tempestade à vista: ventos fortes e cabos soltos acendem alerta
O alerta é ainda mais sério nos primeiros temporais, após um longo período de estiagem, quando o acúmulo de poeira nos isoladores e estruturas da rede elétrica aumenta a chance de falhas e curtos-circuitos.
“Essa chuva funciona como uma lavagem da rede. A água dissolve a sujeira acumulada, formando um caminho condutivo que pode ativar as proteções e causar desligamentos”, explica Vinicyus Lima, gerente do Centro de Operações da Equatorial Goiás.
Além de interrupções no fornecimento de energia, o risco maior está na exposição de cabos energizados nas ruas, especialmente quando há ventos intensos que rompem fios ou derrubam postes. Nesses casos, o cuidado deve ser extremo.
“Jamais toque em fios caídos, mesmo que pareçam inofensivos. Mantenha distância e acione imediatamente a concessionária ou os Bombeiros”, orienta Suzane Caires, executiva de Segurança do Trabalho.
Dentro de casa, também é preciso atenção. “Desligue aparelhos da tomada durante tempestades, e nunca manuseie eletrônicos molhados ou em locais alagados. Se perceber que a água da chuva chegou nas tomadas, desligue o disjuntor e chame um profissional para avaliar”, alerta Suzane. A recomendação vale ainda para casos em que a fiação elétrica mostra sinais de desgaste ou sobrecarga.
Assunção reforça que a responsabilidade principal pela segurança da fiação é das empresas de energia e telecomunicações, mas os municípios também devem fiscalizar. “Se a fiação estiver irregular e causar dano, o cidadão pode recorrer à Justiça. O município também responde pelos prejuízos”, afirma.
O especialista ainda ressalta que o município deve ser responsabilizado nessas situações. “Enquanto não há uma legislação federal que exija o ordenamento da fiação, cabe aos municípios criarem normas locais e cobrir essas lacunas. A omissão de quem deveria fiscalizar também pode ser responsabilizada judicialmente.”
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