Bruno Goulart
O Congresso Nacional vive dias de paralisia, digamos assim. A pressão em torno do projeto de anistia para Jair Bolsonaro (PL) e outros condenados pelos atos golpistas de 8 de janeiro tem dominado os debates e congelado a agenda de votações. Com a oposição mobilizada e o governo na tentativa de frear a proposta, matérias consideradas urgentes ficaram em segundo plano.
Na última reunião com o presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB), o presidente Lula (PT) pediu explicitamente que o projeto não fosse pautado. A avaliação do Planalto é de que a anistia amplia a divisão política e gera desgaste popular, em vez de trazer estabilidade.
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A pressão, no entanto, é forte. O PL insiste em votar a urgência da proposta ainda nesta semana, enquanto o PSD liberou sua bancada, ao evitar fechar posição em defesa do projeto. A disputa já comprometeu o andamento de medidas essenciais, como a MP 1.300, que garante tarifa social de energia gratuita a cerca de 60 milhões de brasileiros. A proposta só foi votada na noite da última quarta-feira (17), no limite do prazo para não caducar. Já a PEC da Blindagem, que aumenta a proteção judicial para deputados e senadores, foi priorizada. O texto foi aprovado em dois turnos: 353 a 134 no primeiro e 344 a 133 no segundo, na última terça (16).
Além disso, outras continuam paradas como o projeto de isenção do Imposto de Renda até R$ 5 mil, que beneficiaria 25 milhões de contribuintes, a reforma administrativa, a PEC da Segurança Pública e a MP 1.303, que trata da taxação de aplicações financeiras. Já o projeto que prevê a redução de 10% dos incentivos fiscais, crucial para fechar o orçamento de 2026, sequer começou a tramitar.
Resistências e alternativas
O Centrão tem demonstrado resistência a uma anistia ampla, especialmente após a condenação de Jair Bolsonaro a 27 anos de prisão pelo Supremo Tribunal Federal. Uma versão mais enxuta da proposta, que exclui líderes do golpe e prevê apenas redução de penas para os manifestantes, é vista como mais viável.
Para o historiador e especialista em políticas públicas Tiago Zancopé, o impasse revela um jogo de forças desequilibrado. “O que está acontecendo é que toda tentativa do governo de construir uma agenda que dependa do presidente da Câmara, Hugo Motta, para avançar, tem sido barrada por ele”, avaliou. Segundo o historiador, Motta, que chegou a ser visto como figura de equilíbrio entre petistas e bolsonaristas, se aproximou mais do Centrão e da oposição.
Zancopé vai além ao comparar o comportamento do atual presidente da Câmara com o de seu antecessor. “As análises políticas que tenho acompanhado dizem que, informalmente, quem continua presidente em exercício é Arthur Lira. Quando você tem um presidente fraco, como é o caso de Hugo Motta, e uma sombra muito grande como Arthur Lira, parece que é Lira quem continua construindo as pautas.”
Críticas e cobranças
Na avaliação de Zancopé, o governo tem falhado em pressionar o comando da Câmara. “O que está faltando para o governo é ter mais força, através da Gleisi Hoffmann e de outros ministros, até mesmo da liderança do Lindbergh Farias, para cobrar Hugo Motta que ele paute aquilo que é relevante para o Brasil sob a interpretação do governo Lula, o que não está acontecendo”, completou.
A deputada federal Adriana Accorsi (PT) também criticou o foco em pautas que, segundo a presidente estadual petista, não respondem às necessidades da população. “Imunidade parlamentar não pode ser confundida com impunidade. E o povo brasileiro já demonstrou que é contra a impunidade na condenação de Bolsonaro e demais integrantes do núcleo crucial da trama golpista”, afirmou ao O HOJE.
Para a parlamentar, as prioridades deveriam ser as medidas de impacto direto na vida das pessoas. “Estamos preocupados com a MP 1.300, que altera a Tarifa Social de Energia Elétrica e beneficia 60 milhões de brasileiros. Outra prioridade é o projeto do governo Lula que trata da isenção do Imposto de Renda até R$ 5 mil, que vai beneficiar 25 milhões de brasileiros. É por isso que meu voto foi não, conforme encaminhamento da liderança da bancada”, destacou. (Especial para O HOJE)
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