A burocracia é um dos males que desde o Império ampliam e revigoram o Custo Brasil, aquele repositório de bizarrices que impede o desenvolvimento da federação e suas unidades. Os três principais pré-candidatos ao Governo de Goiás, Daniel Vilela (MDB), Marconi Perillo (PSDB) e Wilder Morais (PL) pensam diferente em muitos aspectos, mas se unem contra esse freio engatado.
Uma das mães do atraso é a legislação, que de tão ruim parece feita sob encomenda para as irregularidades e se torna incubadora de ladrões de dinheiro público. Uma das piores leis é a de licitações e contratos administrativos, que tanto em sua versão anterior quanto na nova, de 2021, praticamente obriga o concorrente a ser bandido. Para fugir das trapaças, gestores honestos passam longe do monstrengo. Foi assim na saga de encontrar saída para o uso da arrecadação do Fundo Estadual de Infraestrutura, o Fundeinfra, criado em Goiás em dezembro de 2022.
Basicamente, são dois os objetivos do fundo, “gerir os recursos oriundos da produção agrícola, pecuária e mineral no Estado de Goiás, além das demais fontes de receitas definidas nele” e “implementar, em âmbito estadual, políticas e ações administrativas de infraestrutura agropecuária, dos modais de transporte, recuperação, manutenção, conservação, pavimentação e implantação de rodovias, sinalização, artes especiais, pontes, bueiros, edificação e operacionalização de aeródromos”.
Em resumo, o produtor rural passou a colaborar mais com os benefícios de que dispõe. Na marra, mas “colabora”. No período de votações, deu briga não somente verbal, quebra-quebra, reclamações, enfim, normal por se tratar da criação de tributo. Na Inglaterra, novas taxas já aniquilaram rei, então, chutar porta de parlamento é o de menos. O que ficou demais, ruim demais, foi a fórmula de empregar os recursos. Ótimos recursos: mais de R$ 2,5 bilhões juntados até agora.
Marconi Perillo foi governador em quatro mandatos e já gravou vídeo prometendo acabar com o Fundeinfra, que é formado por 1,65% do ICMS, principalmente sobre os produtos do campo. O senador Wilder Morais combate a carga tributária brasileira, as dos Estados incluídas, que chama de “imensa, a maior do mundo”. Como o fundo foi criado por seu grupo, o vice-governador Daniel Vilela não diz sob holofotes que vai liquidar a novidade. Mas seus emissários, que vão às reuniões de agropecuaristas por todo o Estado, adiantam nos sindicatos rurais e nas associações que Daniel vai fulminar o Fundeinfra logo nos primeiros meses de governo. Esclareça-se: de um eventual 2º governo de Daniel, que começaria em janeiro de 2027, pois no mandato-tampão, de abril a dezembro do próximo ano, seria desrespeito ao que ele mesmo ajudou a elaborar.
Qual, então, foi a mudança encontrada pelo governo para escapar das arapucas da Lei de Licitações? Construir as obras via Instituto de Defesa da Agropecuária de Goiás, o Ifag, ligado à Federação da Agricultura e Pecuária de Goiás, presidida pelo ex-deputado federal José Mário Schreiner. A parceria foi aprovada pela Assembleia Legislativa, aquela que teve as portas chutadas durante as votações que gestaram o Fundeinfra. Pelas características jurídicas do Ifag, passa-se ao largo dos coices das licitações. O Ministério Público de Goiás encrespou, recomendou que se abandonasse a ideia, a Procuradoria-Geral do Estado rebate e o impasse está no ar.
É o típico caso em que todos têm razão, cada qual para seu lado. O MP, como fiscal da lei, jamais concordaria com atalhos em uma delas. Porém, o governo está correto: o Fundeinfra é uma invenção tão repelida que só vai funcionar com outra criação que também está sendo impugnada, o acordo com o Ifag. Se houver roubalheira, pune-se quem roubou. Detalhe: a Lei de Licitação, em nenhum caso, inibe ou evita a ladroagem; ao contrário, a estimula.
Então, equivoca-se quem supõe estar na obediência à Lei 14.133/2021 uma fuga da corrupção. Ela praticamente manda os participantes apelarem à improbidade. Não barateia custos. Não preserva qualidade. Não se escolhe o melhor. É um arremedo de coisa séria, porque só na enrolação para se concluir qualquer obra já exige mais dinheiro do que o poupado em eventual irregularidade. Uma licitação, juntados todos os gastos, custa até 20% do total da obra.
Se for cumprir as modalidades de concorrência para infraestrutura, como alguma das rodovias em planejamento, Caiado e Daniel ficarão sem as inaugurações, as empresas de engenharia sem as empreitas, os produtores sem as pavimentações. A burocracia é tamanha que a média de cada licitação passa de um ano. Se for lançado um edital nesta semana, é provável que nenhum canteiro esteja formado para iniciar os trabalhos na eleição de 2026.
A verdade é que não existe modelo ideal para empregar os tributos
A verdade é que não existe modelo ideal para empregar os tributos. Porém, um bom início seria deixá-los sob gerência de quem o recolhe. É exatamente a proposta a se realizar com o Ifag, que é dos produtores rurais, a categoria que paga o Fundeinfra. Se ele roubar, rouba de si mesmo.
O HOJE já publicou que a infraestrutura goiana, sob responsabilidade dos governos estadual e federal, está num atoleiro em comparação com o desenvolvimento de setores como a agropecuária. Falta pavimentação em 8 mil quilômetros de rodovias. Grande parte das GOs não tem sequer acostamento, inclusive as construídas a partir dos anos 1980. Há dez anos não se duplica qualquer estrada. Há mais de meio século nenhuma rodovia é aberta em Goiás.
Desde a Operação Lava Jato, as companhias de asfaltamento padecem da falta de prestígio. Quando se fala em empregar reais do erário com empreiteira e sem licitação, o combo é amaldiçoado antes de terminar a frase. O sistema de gerenciar concorrência, desde o edital até o término das construções, está obsoleto. Uma empresa particular vai da planta ao acabamento de um prédio de 20 andares em Goiânia e Brasília em menos de um ano, mais rápido que um processo licitatório de obra pública.
O produtor rural, assim como o comerciante ou qualquer integrante da sociedade, quer usufruir do benefício legado por seus impostos. Seu veículo quebrar num buraco fica mais caro que qualquer contribuição. Imagina quebrar o ciclo de produção, que é o caso das obras paradas. Ou, pior ainda, nem iniciadas, só prometidas…
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