Bruno Goulart
A contagem regressiva para o julgamento de Jair Bolsonaro (PL), marcado para setembro, não preocupa apenas o mundo político interno. No coração do Supremo Tribunal Federal (STF), cresce a percepção de que Donald Trump pode acionar uma nova rodada de sanções contra o Brasil que mire diretamente ministros da Corte e pressione a economia nacional. A possibilidade de que o embate jurídico se transforme em crise diplomática e econômica já mobiliza o governo Lula (PT) e acende alertas no mercado.
O julgamento de Bolsonaro sobre a trama golpista é visto como um divisor de águas para a democracia brasileira. Entretanto, fontes do Planalto e do Supremo reconhecem que o caso extrapolou as fronteiras nacionais. Em Washington, Trump tem tratado o processo como prova de suposta perseguição política contra o aliado brasileiro — narrativa que encontra eco em alas bolsonaristas e serve de justificativa para medidas hostis.
Pressão pode aumentar
A aplicação de sobretaxas a produtos nacionais e sanções financeiras a ministros, como Alexandre de Moraes, são exemplos da ofensiva norte-americana. Agora, o temor é que a condenação de Bolsonaro seja o estopim para um novo pacote de restrições. Nesse cenário, autoridades brasileiras avaliam que o impacto pode ser devastador, não apenas para o ambiente político, mas também para os bancos e investidores expostos ao dólar.
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Nesse contexto, a decisão do ministro Flávio Dino ganhou protagonismo. Na semana passada, ao afirmar que ordens judiciais e executivas de governos estrangeiros só têm validade no Brasil se confirmadas pelo STF, Dino sinalizou uma postura de confronto em defesa da soberania nacional. A medida foi interpretada como um recado direto ao mercado: instituições financeiras que aplicarem sanções contra magistrados, em cumprimento à Lei Magnitsky americana, podem ser punidas em território brasileiro.
Como consequência, a terça-feira seguinte à decisão foi marcada por turbulência nos pregões. O dólar disparou, a bolsa despencou e, em especial, as ações dos bancos sofreram queda acentuada. Dentro do governo Lula, a reação imediata foi acompanhada com apreensão. Se por um lado a fala de Dino reforçou o discurso nacionalista, por outro trouxe insegurança para investidores e acentuou a tensão com os Estados Unidos.
“Tranquilidade”
Apesar disso, ministros e aliados próximos de Lula procuram transmitir tranquilidade. A avaliação é de que poucos magistrados possuem ativos relevantes nos EUA, o que reduziria o alcance prático das sanções já em vigor. Ainda assim, a possibilidade de extensão das medidas a familiares e a outros integrantes do Tribunal não é descartada, o que alimentaria um clima de incerteza.
Para reforçar o tom político da disputa, a ministra Gleisi Hoffmann, da Secretaria de Relações Institucionais da Presidência da República, foi às redes responsabilizar diretamente Bolsonaro pela escalada da tensão. Em sua visão, Trump age como agressor do sistema financeiro brasileiro, instigado pelo ex-presidente e por seu filho Eduardo. O chamado “Custo Bolsonaro”, segundo Gleisi, recai agora sobre o País em forma de instabilidade econômica e desconfiança internacional.
O discurso encontra respaldo em parte da base governista, que vê na decisão de Dino não uma provocação, mas a reafirmação de uma regra já existente: qualquer determinação estrangeira precisa ser chancelada pelo Judiciário brasileiro para ter efeito. Esse entendimento, no entanto, não diminui a ansiedade de investidores e tampouco garante que Trump recue.
Adicionalmente, diálogos vazados de Bolsonaro com aliados revelaram articulações para usar o apoio norte-americano como barganha em busca de anistia. O temor dentro do STF é que esse tipo de colaboração seja explorado por Trump para intensificar pressões contra o Tribunal justamente no momento mais sensível do julgamento.
Com isso, o Brasil se vê diante de um tabuleiro geopolítico complexo. De um lado, o Supremo promete não se curvar a pressões externas e reafirma sua autonomia. Do outro, o governo Lula tenta equilibrar a retórica de defesa da soberania com a necessidade de preservar a estabilidade econômica. (Especial para O HOJE)
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