Ronaldo Caiado (União Brasil) cumpre a biografia da família e está na quinta geração de Caiado como senador e governador.
Seu vice, Daniel Vilela (MDB), é de um clã que já teve o pai, Maguito, que foi de vereador a governador, tios e primos prefeitos (como Leandro, de Aparecida de Goiânia) e deputados (como Geovan Freitas).
Tião Peixoto (PSDB), pai do presidente da Assembleia, Bruno Peixoto (UB), está em mais um mandato de vereador, assim como um irmão Wellington.
Darci Accorsi, pai da deputada federal Adriana Accorsi (PT), foi prefeito, vereador, deputado estadual e prefeito de Goiânia. No extremo oposto ideológico, o deputado federal Gustavo Gayer (PL) é filho da ex-deputada estadual Conceição Gayer. Ainda no PT, o deputado federal Rubens Otoni é irmão do deputado estadual Antônio Gomide.
No governo Caiado, o secretário de Indústria, Comércio e Serviços, Joel Sant’Anna Braga Filho, é irmão do presidente da Agência de Habitação, Alexandre Baldy. Ambos são filhos do procurador de Justiça Joel Sant’Anna Braga, que cuidava de crianças e adolescentes com o próprio dinheiro e o que arrecadava de artistas como Roberto Carlos e Julio Iglesias, até presidir a fundação estadual da área no Governo Maguito.
Quatro primeiras-damas de Goiás tiveram mandatos parlamentares: Lúcia Vânia (de Irapuan Costa Jr.) e Íris Araújo (de Iris Rezende) foram deputadas federais e senadoras, Maria Valadão (de Ary Valadão) e Lídia Quinan (de Onofre Quinan) foram deputadas federais.
Achou muito em Goiás? Pois no restante do País, sobretudo no Nordeste, é ainda mais frequente o rodízio entre possuidores de sobrenomes famosos.
Juliana Brizola (PDT), ex-deputada estadual e líder nas pesquisas para o Governo do Rio Grande Sul, é neta de Leonel Brizola, que foi governador de lá e do Rio de Janeiro. Brizola Neto, seu irmão gêmeo, foi ministro do Trabalho de Dilma Rousseff (PT) e vereador carioca. O ex-governador Tarso Genro (PT) é pai da ex-deputada federal e agora estadual Luciana Genro (PSol). Como um gaúcho pode entrar na política sem ser de família do ramo?
O presidente nacional do PSB, João Campos, prefeito reeleito de Recife, namora a deputada federal Tabata Amaral (PSB-SP). É favorito para governador de Pernambuco, cargo que já foi de seu pai, Eduardo Campos, e de seu avô, Miguel Arraes. Sua avó Ana Arraes acaba de ser presidente do Tribunal de Contas da União. Sua prima Marília Arraes, ex-deputada federal, deixou de se eleger governadora duas vezes, uma (em 2018) porque o PT a impediu de ser candidata e outra (2022) porque o marido da vencedora, Raquel Lyra (PSDB), morreu na véspera da votação. Raquel é filha do ex-governador João Lyra Neto e sobrinha do ex-ministro da Justiça Fernando Lyra. Seu avô João Soares Lyra Filho foi deputado estadual e federal e prefeito de Caruaru, assim como seu pai e ela mesma. Alguém aí encara a política pernambucana sem ser Campos, Lyra, Arraes ou de outro clã?
E assim por diante – ou para trás. No Nordeste, o mandato em casa vem desde as capitanias hereditárias. Só é possível citar uma fração dos casos. Para lembrar apenas um exemplo da Paraíba, o senador Efraim Filho, pré-candidato a governador, é filho de Efraim Morais, que foi senador, presidente da Câmara dos Deputados e diversas vezes secretário estadual.
Em Alagoas, os sem-sobrenome estão excluídos. O ex-ministro e ex-presidente do Senado Renan Calheiros, atual presidente da Comissão de Assuntos Econômicos do Senado, é irmão do deputado estadual Olavo Calheiros e do deputado federal por Pernambuco Renildo Calheiros, além de pai do ministro dos Transportes de Lula, Renan Filho, que está licenciado como senador, foi governador e é favorito para voltar ao cargo. É enrolado até para ler, porém é assim que é.
Os grandes rivais dos Calheiros em Alagoas são os Lira (diferente dos Lyra com y do Pernambuco), como Artur, que manda na Câmara dos Deputados e quando não é ele próprio o presidente, manda também no presidente. Está no 9º mandato parlamentar. Seu pai foi prefeito e senador. Em 2023, Artur indicou um deputado de Roraima, Jhonatan de Jesus, para ministro do Tribunal de Contas da União. Neste ano, colocou no mesmo TCU Marluce Caldas, tia do prefeito de Maceió, seu aliado JHC. Não, você não conhece ninguém, além dele, que tenha indicado dois ministros de tribunal em dois anos. Nem espere citação à família Collor, que teve epílogo com o cumprimento de pena pelo ex-presidente Fernando.
No Maranhão, ninguém vence os Sarney, ao menos não em número de autoridades. O patriarca José, imortal da Academia Brasileira de Letras, teve todos os cargos até ser presidente da República. Seus parentes tiveram trocentos mandatos. O maior destaque é para sua filha Roseana, que só não chegou ao Palácio do Planalto por um erro da Polícia Federal, que fez buscas em seu escritório quando ela liderava as pesquisas para presidente em 2002. Claro, a operação midiática deu em nada, mas anulou a pré-candidatura. Atualmente, Roseana é deputada federal e enfrenta um câncer de mama. Inclusive, apareceu de cabeça raspada, consequência do tratamento. O ex-governador Flávio Dino, atualmente no Supremo Tribunal Federal, é filho de Sálvio Dino, que foi prefeito e deputado estadual.
Sucesso e fracasso nos sobrenomes do Norte
O Norte do País também é pródigo na herança política. Há dezenas de lições, nenhuma comparável à sobrevivência dos Barbalho, no Pará. Em 1982, Jader Barbalho era a esperança de mudança diante das décadas de mando das oligarquias. Ganhou para governador e criou a própria. Ganhou cargo de deputada federal para a mulher, Elcione. Ela se separou dele, não da Câmara: está lá desde 1995. O filho Helder, atual governador reeleito, foi capaz de uma proeza: teve dois ministérios (Portos e Pesca) com Dilma Rousseff, ela caiu, Michel Temer entrou e ele subiu para ministro da Integração Nacional. Lula voltou ao poder e os Barbalho voltaram à Esplanada, agora com Jader Filho no Ministério das Cidades. José Priante, primo de Helder e Jader Filho, está no 9º mandato parlamentar, 7º na Câmara dos Deputados. Outro primo, Igor Normando, ex-vereador e deputado estadual, é genro do prefeito de Cabo de Santo Agostinho, no Pernambuco.
Há no Norte uma lição que desmente as teses de sucesso da familiocracia: o presidente do Senado, Davi Alcolumbre, tem um irmão que coleciona insucessos. Josiel Alcolumbre foi talhado pelo clã a prefeito de Macapá no ano passado. Como o prefeito Antônio Furlan tinha mais de 90% de aprovação, os Alcolumbre colheram a primeira derrota, não conseguiram emplacar Josiel como candidato. Tudo bem, tenta a Câmara Municipal, vai lá e brilha. Foi lá, mas não conseguiu chegar: teve 2.561 votos e não se elegeu vereador. Tratou-se de uma vingança: em 2022, Davi se reelegeu senador vencendo (por pouco, mas venceu) a mulher do prefeito, Rayssa Furlan, na eleição que marcou uma pausa nos mandatos de outra família, a Capiberibe. O patriarca, João Capiberibe, havia sido prefeito da Capital, governador e senador. Contra Rayssa e Davi, teve míseros 5,37%. Seu filho Camilo foi governador. Sua mulher, Janete, foi vereadora e deputada federal.
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