O envelhecimento da população brasileira está transformando o cuidado com idosos em um setor estratégico da economia. O que antes era visto como uma atividade doméstica ou uma responsabilidade familiar, hoje desponta como mercado em expansão, com potencial bilionário e em busca de regulamentação.
O Brasil vive uma transição demográfica acelerada. Entre 2012 e 2022, a população com 60 anos ou mais cresceu 57,4%. De acordo com o Censo de 2022, 10,9% dos brasileiros já têm mais de 65 anos — o maior percentual da história. Esse crescimento pressiona as famílias e os sistemas de saúde, impulsionando a busca por profissionais qualificados para acompanhar a rotina de idosos.
A força dos cuidadores informais
Dados do IBGE apontam que, entre 2016 e 2019, o número de pessoas dedicadas a cuidar de indivíduos com 60 anos ou mais passou de 3,7 milhões para 5,1 milhões. A maioria, porém, atuava sem remuneração: cerca de 78,8% eram cuidadores informais, muitas vezes parentes. Estudos mostram que essa responsabilidade recai majoritariamente sobre mulheres, em especial mulheres negras, evidenciando desigualdade de gênero e de raça no cuidado.
O avanço da demanda por cuidadores remunerados é visível nos números oficiais. Levantamento do Instituto de Longevidade mostra que, em 2024, aproximadamente 21% dos trabalhadores domésticos atuavam como cuidadores, percentual que era de 13,9% em 2014. Entre 2019 e 2023, a procura formal por cuidadores cresceu 15%, alcançando cerca de 840 mil profissionais. Dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) confirmam a tendência: entre 2012 e 2022, o número de cuidadores registrados saltou de 5.263 para 34.054, um crescimento de 547%.
Do ponto de vista econômico, o setor já movimenta cifras expressivas. Estimativas apontam que o mercado de cuidados para idosos no Brasil alcançou US$ 82,6 bilhões em 2023, com projeção de chegar a US$ 124,4 bilhões até 2030. A taxa média de crescimento anual prevista é de 8%, o que coloca o segmento como um dos mais promissores da chamada “economia prateada” — voltada às necessidades da população idosa.
Perfil dos profissionais e desigualdades
O setor de cuidado como um todo já emprega 24 milhões de brasileiros, segundo estudos recentes. Desse total, 75% são mulheres. No núcleo específico dos cuidados domiciliares e diretos, 98% dos profissionais são mulheres, e quase metade se autodeclara negra. Esses dados revelam não apenas a força de trabalho do setor, mas também as desigualdades que ainda persistem.
A profissionalização do cuidador exige capacitação técnica e preparo emocional. Além de apoiar a mobilidade, alimentação e medicação, os profissionais precisam lidar com doenças crônicas, situações de vulnerabilidade e com a solidão que muitas vezes acompanha a velhice. O trabalho é reconhecido como essencial para prevenir internações e garantir qualidade de vida, mas ainda carece de suporte e regulamentação.
Inovação, regulamentação e futuro do setor
Nos últimos anos, empresas de home care e franquias especializadas em serviços de cuidado domiciliar têm se multiplicado no país. Elas oferecem desde acompanhamento noturno até suporte em casos de Alzheimer e fisioterapia em casa. Plataformas digitais e startups também começam a atuar, conectando famílias a cuidadores autônomos e oferecendo sistemas de pagamento e monitoramento.
A inovação tecnológica é outro vetor de crescimento. Dispositivos de monitoramento remoto, sensores de movimento e telemedicina já são incorporados a serviços de cuidado domiciliar. A combinação entre presença humana e tecnologia deve ser uma das marcas do setor na próxima década, permitindo ampliar a segurança e a autonomia dos idosos.
Apesar do avanço, a profissão ainda carece de regulamentação nacional consolidada. Projetos de lei em tramitação no Congresso buscam definir requisitos, atribuições e formação mínima, mas a ausência de norma clara gera insegurança jurídica e mantém grande parte dos contratos na informalidade.
Desafios e oportunidades econômicas
A remuneração dos cuidadores varia conforme a região e a forma de contratação. Em média, profissionais autônomos recebem entre R$ 1.800 e R$ 3.000 mensais. Em empresas ou clínicas, os valores podem ser mais altos, mas a exigência de cursos e certificações também é maior. A rotatividade, impulsionada pelo desgaste físico e emocional, é um dos desafios mais apontados por especialistas.
O envelhecimento populacional não é apenas um dado demográfico, mas um fenômeno que transforma a economia. O cuidado com idosos movimenta empresas, plataformas digitais, serviços de saúde e cursos de capacitação. É um setor que gera emprego, abre espaço para empreendedores e, ao mesmo tempo, levanta desafios de políticas públicas e de direitos trabalhistas.
Ao consolidar-se como profissão, o cuidador de idosos representa um elo fundamental entre famílias, saúde e mercado. A expectativa é que, até 2030, o setor se expanda em ritmo constante, ampliando sua relevância na economia nacional. O cuidado, que sempre foi visto como uma tarefa doméstica, se tornou um negócio em crescimento, com impacto direto na vida de milhões de brasileiros e na construção de um país que envelhece em ritmo acelerado.