Apesar do bom desempenho do programa Minha Casa, Minha Vida, o setor imobiliário brasileiro enfrenta um momento delicado. Entre janeiro e abril de 2025, o crédito destinado à produção imobiliária caiu 49%, segundo dados da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC).
Em 2024, os recursos disponíveis somavam R$ 50 bilhões. Neste ano, o volume projetado despencou para apenas R$ 20 bilhões — reflexo direto da significativa saída de recursos da caderneta de poupança, principal fonte de financiamento do Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo (SBPE). Somente em maio, os saques líquidos superaram a marca dos R$ 10 bilhões.
Essa retração no crédito traz dois efeitos centrais ao mercado, conforme explica o especialista em financiamento imobiliário Daniel Claudino. “A primeira consequência está na produção. Sem financiamento, as incorporadoras reduzem o número de lançamentos, o que impacta a oferta e pressiona os preços para cima. A segunda frente é o acesso do consumidor final ao crédito, essencial para a aquisição da casa própria. Nesse cenário, a classe média é a mais prejudicada, já que não se enquadra no Minha Casa, Minha Vida e tampouco possui capital próprio para investir”, analisa.
Contudo, Goiânia segue em uma dinâmica distinta da observada no cenário nacional. A Capital mantém um ritmo constante de lançamentos imobiliários, sustentada por um ecossistema de incorporadoras robustas financeiramente e com acesso a fontes alternativas de financiamento.
“As empresas locais fazem uso recorrente das Sociedades em Conta de Participação (SCPs), um instrumento que permite a captação direta de recursos de investidores privados para a viabilização de empreendimentos. Isso reduz consideravelmente a dependência do crédito bancário tradicional”, afirma Claudino.
Embora esse modelo não seja novidade no Brasil, ganhou força em Goiânia por características regionais específicas. Segundo o especialista, o perfil dos empreendedores locais têm forte vínculo com o agronegócio e adota uma lógica patrimonialista de longo prazo, o que favorece os aportes diretos. “Replicar essa estratégia em outras capitais exige mais do que mudar regras jurídicas. É necessário que exista um ambiente econômico e cultural que sustente esse tipo de operação.”
Outro fator que impulsionou os lançamentos na cidade foi a recente revisão do Plano Diretor de Goiânia. Com as novas regras, zonas de desaceleração foram delimitadas em regiões valorizadas como Bueno, Oeste e Jardim Goiás. “Construtoras que já tinham projetos aprovados estão correndo para colocá-los no mercado, temendo perder o direito de construir prédios mais altos. Essa urgência gerou um movimento intenso no setor local”, aponta Claudino.
Apesar do ritmo acelerado, o especialista faz um alerta: é preciso cuidado para evitar um descompasso entre a oferta de imóveis e a demanda real. “Se os lançamentos não forem pautados por estudos consistentes de mercado, o risco é o surgimento de um excesso de unidades. Por outro lado, do ponto de vista social, a ampliação da oferta é benéfica. Mesmo que parte dos imóveis leve mais tempo para ser vendida, há absorção por meio da locação, o que ajuda a estabilizar os preços e atender melhor a classe média urbana.”
Outro desafio relevante para o setor é o cenário de juros elevados. “As altas taxas impactam toda a cadeia da construção. Mesmo os investidores que trabalham com capital próprio sentem os efeitos, porque o ritmo de vendas desacelera e o custo para levantar recursos aumenta”, explica Claudino. Já em relação à inflação, ele pondera: “Seu impacto é mais relativo. Pior que a inflação é a deflação. Um imóvel que não se valoriza tira o atrativo do investimento, o que felizmente ainda não é o nosso caso.”
Para ampliar o acesso ao crédito habitacional, Claudino defende mudanças estruturais no modelo de funding. “O Brasil depende excessivamente de dois pilares: o FGTS e a poupança. Quando há queda na captação, o sistema de concessão de crédito entra em crise. Uma alternativa seria fortalecer a Caixa Econômica Federal com recursos do pré-sal e atrair capital de fundos institucionais estrangeiros. Isso daria fôlego ao crédito e permitiria atender públicos atualmente negligenciados, como a classe média.”
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