A Câmara dos Deputados aprovou nesta quarta-feira, por 313 votos favoráveis e 119 contrários, o requerimento de urgência de um projeto de lei que busca impedir a aplicação de uma resolução do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda) relacionada ao aborto legal em menores de 14 anos.
Com a urgência aprovada, o texto poderá ser votado diretamente no plenário, sem passar pela análise das comissões. A votação do mérito está prevista para ocorrer ainda nesta sessão, de acordo com a Mesa Diretora.
A proposta foi apresentada pela deputada Chris Tonietto (PL-RJ) e recebeu apoio de parlamentares do PP, PL, PSD, Republicanos, União Brasil e MDB. O relator é o deputado Luiz Gastão (PSD-CE). O projeto pretende sustar a resolução do Conanda publicada em janeiro, que orientava que menores de 14 anos poderiam realizar aborto legal em qualquer fase da gestação nos casos previstos pela legislação brasileira.
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Orientações do Conanda sobre aborto
A resolução do Conanda — órgão vinculado ao Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania, composto por representantes do governo e da sociedade civil — estabelecia orientações para o atendimento de menores vítimas de violência sexual. Entre as diretrizes, o texto afirmava que o procedimento poderia ser realizado “independentemente de lavratura de boletim de ocorrência, de decisão judicial autorizativa e de comunicação aos responsáveis legais”, indicando que esses elementos não deveriam servir como impedimento ao atendimento.
O documento também destacava que “o limite de tempo gestacional para a realização do aborto não possui previsão legal, não devendo ser utilizado pelos serviços como instrumento de óbice para realização do procedimento”. A resolução ainda mencionava que o método a ser utilizado deveria seguir “evidências científicas e recomendações da Organização Mundial da Saúde (OMS)”.
Durante a sessão, parlamentares se posicionaram de forma divergente sobre o tema. Deputadas contrárias ao projeto defenderam a manutenção das orientações do Conanda. No plenário, a deputada Fernanda Melchionna (PSOL-RS) declarou: “Menina não é mãe, estuprador não é pai, respeitem a lei brasileira”.
A deputada Chris Tonietto, autora do projeto, argumentou que a resolução deveria ser sustada. Em sua justificativa, afirmou: “Seu conteúdo, além de ilegal, importa na promoção de uma política atentatória ao mais basilar dos direitos humanos: a vida”.
Deputada Chris Tonietto (PL), é autora do projeto
A resolução, publicada no Diário Oficial da União no início deste ano, possui natureza normativa e funciona como orientação para serviços de saúde e instituições do sistema de garantia de direitos. Ela detalha procedimentos permitidos pela legislação brasileira, que autoriza o aborto em casos de gravidez resultante de violência sexual, risco de vida para a gestante e anencefalia.
Números
Os dados mais recentes mostram a dimensão do tema no Brasil. Em 2023, quase 14 mil meninas de 10 a 14 anos tiveram filhos, e apenas 154 delas acessaram o aborto legal nos casos previstos pela lei. Outro levantamento revela que, entre 2015 e 2020, mais de 132 000 meninas de 10 a 14 anos foram vítimas de estupro de vulnerável; nesse período, apenas 362 receberam o aborto legal — menos de 4 % das que engravidaram.
No período de 2011 a 2021, foram identificados 107,8 mil nascidos vivos de mães entre 10 e 14,5 anos de idade — média de 26 nascimentos por dia nessa faixa etária.
Com a aprovação da urgência, o projeto segue diretamente para votação no plenário da Câmara. Caso seja aprovado, encaminhar-se-á ao Senado Federal para apreciação.
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