Goiás tem 246 municípios, mas em época de candidaturas majoritárias gerais as notícias forçam a aparência de que existem no Estado no mínimo mil prefeitos. Cada candidato sonha que está andando com centenas a seu lado. Vive-se o momento de pré-campanha, então, é a hora do cachorro louco não por ser o mês de agosto. Está sendo assim com o vice-governador Daniel Vilela, que tem o apoio divulgado de cerca de 200 prefeitos. Não se trata de novidade.
Foi assim em 1998
O à época senador Iris Rezende contava com o apoio dos chefes de Executivo de mais de 200 cidades. Seus índices nas pesquisas nunca eram inferiores a 80%. Não tinha erro: já havia conquistado novamente o Palácio das Esmeraldas, residência oficial do governador de Goiás. Faltou combinar com o eleitorado: perdeu para Marconi Perillo, um deputado federal lançado de última hora pela oposição, que rastejava no fim da fila com 6%.
Foi assim em 2002
Iris tentava a reeleição ao Senado contando com a ajuda de mais de 100 prefeitos, inclusive alguns que estavam com Marconi. De novo, aparecia com cerca de 90% nos levantamentos. Eram duas vagas. Não tinha erro: podia preparar o terno para a nova posse e ter mais oito anos em Brasília. Faltou combinar com o eleitorado: ficou em 3º lugar, atrás de Demóstenes Torres e Lúcia Vânia.
Foi assim em 2018 para governador
O governador José Eliton havia substituído Marconi em seu 4º mandato e sobrevivido a um atentado em Itumbiara, em que um dos mortos era o ex-deputado federal José Gomes. Seriamente ferido, o governador ficou nas manchetes nacionais durante muito tempo, sempre se ressaltando seu heroísmo. No cargo máximo, pilotava o maior programa de obras de todos os tempos no Estado. Tinha o apoio de mais de 200 prefeitos. Não restava brecha para erro: estava reeleito com facilidade. Faltou combinar com o eleitorado: ficou em 3º lugar, atrás de Ronaldo Caiado e Daniel Vilela.
Foi assim em 2018 para senador
Na eleição em que Eliton se deu mal, não havia dúvidas de que Marconi e Lúcia seriam eleitos para o Senado. De fato, eram campeões em obras e assistência para os municípios. Por isso, tinham apoio de 220 prefeitos. Nas pesquisas, estavam disparados na frente. Marconi, então, teria uma votação recorde, superaria a marca considerada inalcançável de Demóstenes em 2010, 2.158.812 votos. Eram duas vagas, uma dele, outra de Lúcia. Nem tico, tem taco. Ganharam Vanderlan Cardoso e Jorge Kajuru. Marconi ficou em 5º lugar, Lúcia em 4º, juntando os dois não tiveram 1 milhão de votos.
Foi assim também em 2022
O raio caiu outra vez no mesmo lugar, a cabeça de Marconi, que competia com o Delegado Waldir para o Senado. Não tinha erro, ou era um ou o outro. Marconi havia passado os últimos quatro anos em campanha, até prefeitos ligados ao governador Ronaldo Caiado o apoiavam. Waldir era o principal candidato do caiadismo, estava no partido do governador e concentrava os prefeitos da base aliada do palácio. Os suplentes de Marconi Perillo eram de duas das famílias mais ricas do Brasil, os Lage de Goianésia e os Morais, da Votorantim, uma gigante da economia nacional. Jorrava dinheiro diuturnamente. Nenhum espaço para erro: dava Waldir ou Marconi, cuja campanha era maior que a de Caiado para a reeleição. Nem tik, nem tok. Deu Wilder, que ficara em casa o tempo quase todo.
Por que apoio de prefeito não rende
São diversos os motivos para que prefeitos bem avaliados não façam boa figura nos apoios a seus candidatos a governador. O maior deles é não se abraçar a quem está se afogando – se o candidato é ruim, quem o lançou que se lasque. Outro é a simpatia pessoal – já vou fazer campanha de graça para os outros, então que esse outro seja pelo menos parecido comigo na simpatia. Faz a diferença também que o apadrinhado seja parecido com o padrinho – se um é simples, o outro deve ser simplíssimo; se um é rústico, é tarefa do outro imitá-lo; se um é madrugador, o outro tem obrigação de não ser preguiçoso.
O candidato a governador deve agradar a todos: ao prefeito, à mulher do prefeito, aos aliados do prefeito, à base do prefeito na Câmara Municipal, aos ocupantes de cargos estaduais no município. Se for um nutella metido a roceiro, a máscara cai com facilidade.
Bobagem esperar voto em município só por ter apoio oficial
Os vencedores nas eleições com zebra foram candidatos praticamente sem apoio de prefeito. Por isso, não é mais surpresa quem é apoiado por meia dúzia de municípios golear aquele que se diz ajudado por meio mundo. Tome-se de exemplo em 1998. Iris contava com mais de 200 prefeitos e Marconi tinha Nion Albernaz em Goiânia, Valcenôr Braz em Luziânia, Nelci Spadoni em Rio Verde e mais uma meia dúzia de 3 ou 4.
Nas eleições de 2002 para senador, os prefeitos preferiam os dois que estavam nas vagas, Iris Rezende e Mauro Miranda, e a então ex-ministra Lúcia Vânia, recém-saída do 1º escalão do governo de Fernando Henrique Cardoso, a ótima pasta do Social. Ao contrário, Demóstenes Torres havia sido procurador-Geral de Justiça e, como chefe do Ministério Público, instalara a Procuradoria de Prefeitos para processar quem cometia crimes nos municípios. Na hora de votar, o eleitor preferiu quem mandava prefeito para os tribunais aos que mandavam verbas para os prefeitos.
Em 2018, Caiado não tinha sequer dez prefeitos em sua campanha. E ganhou no 1º turno. José Eliton, que estava no exercício da governadoria, era levado para cima e para baixo por seus 200 e tantos prefeitos. O disparate era tamanho que Caiado prometeu reservar no Centro Administrativo uma sala para vereadores, devido a sua importância – ao contrário dos prefeitos, que se dividiram entre Eliton (o 3º nas urnas) e Daniel Vilela (o 2º).
Para o Senado, em 2018, poucos prefeitos ajudaram Vanderlan Cardoso e pouquíssimos ficaram com Jorge Kajuru. Quem não estava com Marconi Perillo e Lúcia Vânia foi fiel a quem mais os ajudava, Wilder Morais. No fim das contas, o eleitor deu uma banana – uma banana de dinamite para Marconi e Lúcia, uma banana split para Kajuru e Vanderlan.
Mas não há disparidade maior do que a ocorrida com Wilder em 2022. Caiado já dispunha da popularidade de agora e, por insistência de seus aliados, traçou-se a estratégia de lançar três candidatos ao Senado: Waldir (União Brasil), Alexandre Baldy (PP) e Vilmar Rocha (PSD). No frigir das urnas, mesmo que houvesse duas vagas, a base governista não faria senador: Wilder ficou em 1º, Marconi em 2º, Waldir em 3º e Baldy em 4º.
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