Bruno Goulart
“O que o Supremo Tribunal fez foi reconhecer a ele o direito constitucional de não se autoincriminar.” Foi assim que o advogado criminalista e conselheiro federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Pedro Paulo de Medeiros, analisou, ao O HOJE, a decisão do ministro André Mendonça que desobriga Antônio Carlos Camilo Antunes, conhecido como “Careca do INSS”, de comparecer à Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) do INSS.
Medeiros destacou que a medida não surpreende do ponto de vista jurídico. “A decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal, André Mendonça, acaba frustrando a expectativa da CPMI, que havia convocado o senhor Antônio Carlos Camilo para depor. Mas o que ele obteve junto ao ministro André Mendonça segue a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal de anos”, avalia o advogado.
O jurista explica que, como investigado, Antunes tem direito de permanecer em silêncio sem que isso seja usado contra ele. “Esse silêncio não pode ser interpretado contra ele ou causar qualquer prejuízo”, observou. Para Medeiros, obrigá-lo a ir até a CPMI apenas para exercer esse direito seria um “constrangimento desnecessário”.
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O advogado lembrou ainda que já houve casos em que comissões tentaram enquadrar depoentes que se calaram, inclusive com ameaça de prisão em flagrante. “Como a própria CPMI pode acabar dando voz de prisão em flagrante a quem se recusa a responder, obrigá-lo a comparecer acaba sendo um constrangimento desnecessário”, observa.
Na avaliação de Medeiros, não faria sentido manter a convocação se o investigado já havia antecipado que permaneceria em silêncio. “Se a única razão para ele ir à CPMI seria para chegar lá e exercer o direito dele ao silêncio, que a Constituição garante e o próprio Supremo Tribunal Federal reconheceu a ele, é lógico que não faz qualquer sentido obrigar a sua presença”, completou.
Reação bolsonarista
Do ponto de vista político, porém, a decisão gerou forte reação. O presidente da CPMI, senador Carlos Viana (Podemos-MG), lamentou a ausência e disse que o colegiado “perdeu a oportunidade de ouvir um dos principais investigados do escândalo”. Outros parlamentares bolsonaristas foram ainda mais duros. O deputado Zé Trovão (PL-SC) acusou Mendonça de ter “pisado na bola feio”, enquanto o senador Marcos Rogério (PL-RR) pediu que a decisão seja levada ao plenário do Supremo.
O senador Magno Malta (PL-ES) também criticou a decisão, ao afirmar que “quem é evangélico deveria ter empatia com as milhares de pessoas roubadas” pelo esquema. O parlamentar chegou a insinuar que o ministro teria sido alvo de chacota: “Deve estar assistindo a gente da TV zombando e rindo da gente”.
A tensão se explica pela dimensão do escândalo. De acordo com a Polícia Federal, Antunes seria um dos operadores de um esquema que desviou até R$ 6,3 bilhões de aposentadorias e pensões. O “careca do INSS” teria recebido R$ 53,5 milhões por meio de entidades associativas e repassado cerca de R$ 9,3 milhões a servidores e empresas ligadas à cúpula do INSS. A defesa, no entanto, nega as acusações e classificou como “bizarrice” a versão de que ele seria o operador da fraude.
O cancelamento do depoimento desta terça-feira (16) frustrou a CPMI, que esperava obter informações novas com Antunes. A comissão deve ouvir familiares e sócios de investigados nesta quinta-feira (18), em uma tentativa de manter a apuração em andamento.
Enquanto isso, permanece o contraste: a decisão de Mendonça, ministro “terrivelmente evangélico” indicado por Bolsonaro ao STF, desagradou justamente aos parlamentares mais próximos do ex-presidente. Isso apenas atesta a isonomia da Suprema Corte brasileira. Para juristas como Pedro Paulo de Medeiros, porém, não houve inovação — apenas a reafirmação de um direito fundamental já reconhecido em inúmeras outras CPIs. (Especial para O HOJE)
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