Bruno Goulart
O debate sobre a anistia aos envolvidos nos atos golpistas de 8 de janeiro se transformou em um impasse político que extrapola a discussão jurídica. De um lado, lideranças da direita pressionam pela votação imediata no Congresso. Do outro, o presidente Lula (PT) já prometeu vetar qualquer proposta aprovada, e o Supremo Tribunal Federal indica que não aceitará mudanças que esvaziem os julgamentos já realizados.
O cenário ficou ainda mais tenso após declaração de Eduardo Bolsonaro nas redes sociais, nesta sexta-feira (5). Em mensagem publicada no X, o deputado afirmou: “Eu sei que vocês querem tirar meu pai da anistia para poder chantageá-lo e forçá-lo a escolher o candidato que vocês querem emplacar. Qualquer anistia que não seja ampla e irrestrita não será aceita. Já irei conversar com a base parlamentar do PL sobre isso. A anistia será ampla e irrestrita ou não contará com o apoio da direita e não terá efeito de diminuir as sanções internacionais. Esses planinhos escusos de vocês não irão prosperar. Vocês estão brincando com coisa séria e vão acabar sendo vistos como colaboradores dos violadores de direitos humanos.”
Rumos da anistia
A fala escancara a divisão sobre os rumos da anistia. Enquanto setores do Congresso, como os ligados ao presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), articulam uma proposta mais restrita que deixaria Jair Bolsonaro de fora, deputados bolsonaristas exigem que o perdão seja total. A ameaça de retaliação política, com possível obstrução de votações importantes como a reforma do Imposto de Renda, coloca ainda mais pressão sobre o centrão.
Leia mais: Mudanças na Ficha Limpa: avanço contra exageros ou brecha para impunidade?
Nos bastidores, o PT tem atuado para conter a ofensiva. O líder da sigla na Câmara, Lindbergh Farias, tem dito a parlamentares que Lula vetará qualquer projeto de anistia, e que o gesto valerá tanto para iniciativas da Câmara quanto do Senado. A mensagem busca desestimular movimentações de centro que possam dar fôlego ao bolsonarismo.
Para o cientista político Lehninger Mota, ouvido pelo O HOJE, a chance de o projeto prosperar é baixa, mas a disputa serve a outros objetivos. “Nós temos que analisar que um projeto de anistia geral e restrita, como alguns deputados mais ligados ao Bolsonaro propõem, é muito provável que não passe e mais provável ainda que seja vetado pelo Lula, que pode ser derrubado pelo Congresso, mas a questão é que pode ser judicializado e o Supremo novamente vai dar a última palavra e eles não vão fazer letra morta de um julgamento que eles mesmos fizeram, certo?”, explica.
Segundo Mota, a insistência em defender a anistia revela muito mais sobre os cálculos políticos em curso do que sobre a viabilidade da proposta. Ele aponta que a movimentação expõe quem está disposto a se alinhar com Jair Bolsonaro no campo da direita, quem testa capacidade de articulação no centro e quem busca se projetar para 2026. “Além de ganhar a confiança do Bolsonaro por colocar a cara a tapa e falar que é a favor da anistia, que isso que estão fazendo com o Bolsonaro é uma covardia, eles radicalizam o discurso e, ao mesmo tempo, testam popularidade e capacidade de articulação entre os partidos”, acrescenta.
O pano de fundo desse impasse também envolve a pressão internacional. Nos últimos meses, autoridades americanas reforçaram críticas a ataques contra a democracia no Brasil. Para aliados de Bolsonaro, a anistia seria um gesto capaz de reduzir as tensões externas. Já para ministros do STF, a proposta é inaceitável porque significaria deslegitimar os próprios julgamentos, inclusive os que condenaram militares e lideranças políticas envolvidas no 8 de janeiro.
Em síntese, a polêmica em torno da anistia não caminha para uma solução imediata. Nesse balaio, é necessário separar quem cometeu o crime de multidão, como no 8 de janeiro, dos “peões do golpe”, que, de dentro de seus gabinetes, usando recursos públicos, tentaram golpear a democracia brasileira em benefício próprio.
O post Sem anistia para Bolsonaro? Impasse acirra tensão entre STF, Planalto e direita apareceu primeiro em O Hoje.