Bruno Goulart
A sessão plenária desta quarta-feira (8) é um retrato fiel do que tem sido o cotidiano da Assembleia Legislativa de Goiás (Alego). Em vez de discutir os problemas do Estado, os parlamentares ocuparam a tribuna com pautas nacionais, disputas partidárias e até anúncios pessoais.
O deputado Amauri Ribeiro (PL), por exemplo, usou o pequeno expediente para falar sobre anistia e chamar a condenação do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) de “farsa”. Gustavo Sebba (UB) defendeu um vereador de Buriti Alegre acusado de perseguição política. Já Bia de Lima (PT) rebateu o governador Ronaldo Caiado (UB) sobre repasses federais para a saúde, ao defender o presidente Lula (PT) e afirmar que foi o próprio Estado que deixou de licitar obras na área, o que teria impedido a transferência de recursos pelo governo federal.
Enquanto isso, uma audiência pública tratava de “aborto aos 9 meses: crime contra a humanidade”. Um tema polêmico, mas que pouco dialoga com os desafios diários dos goianos.
E essa rotina custa caro. Manter a estrutura da Alego consome R$ 235,2 milhões por ano, o equivalente a R$ 19,6 milhões mensais. É o preço que a população paga por uma instituição que se tornou mais eficiente em criar benefícios para si do que em produzir resultados para o cidadão.
Superparlamentares
O mestre em História e especialista em Políticas Públicas, professor Tiago Zancopé, avalia que a Alego se transformou em uma máquina pesada e ineficaz. Zancopé afirma que, desde a eleição do presidente Bruno Peixoto (UB), a Casa concentrou esforços em “estruturar o trabalho do deputado estadual” e criou condições para que cada um se tornasse um “superparlamentar com poderes incríveis dentro do Estado de Goiás”.
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Segundo Zancopé, a estrutura administrativa ficou “muito robusta” e as condições de trabalho dos deputados “incrivelmente facilitadas” — mas nada disso se traduziu em políticas públicas de qualidade. O especialista em Políticas Públicas diz que a Alego “ganhou muita estrutura, mas parece que se perdeu no caminho”.
O pesquisador compara o Legislativo goiano a um “gigante de pés de barro”, que cresceu demais, mas perdeu o foco. “A Alego hoje não sabe qual política pública vai produzir, porque ficou grande demais”, afirma.
Sem políticas públicas relevantes
Na avaliação de Zancopé, se tornou difícil identificar qualquer política pública relevante criada pela Casa. “Quando penso no que a Alego entregou nos últimos anos, lembro de compra de carro, caminhonete, SUV, do avião que a Assembleia está usando em parceria com o Corpo de Bombeiros. Agora, eu não consigo identificar uma política pública”, admite. Vale questionar o papel propositivo do parlamento. Não há, nos últimos anos, pautas de grande impacto que tenham nascido da iniciativa dos deputados.
Os poucos momentos de destaque da Casa foram pontuais, lembra o especialista — como as audiências sobre a concessão do Estádio Serra Dourada e a aprovação do estado de calamidade em Goiânia. Essa, inclusive, aprovada mesmo com pareceres contrários do Tribunal de Contas dos Municípios (TCM-GO) e Ministério Público de Contas (MPC-GO) para agradar as vontades do prefeito Sandro Mabel (UB).
Câmara de Goiânia é mais ativa
Enquanto isso, a Câmara de Goiânia tem se mostrado mais ativa e próxima das demandas da população. Zancopé explica que a relação conflituosa entre o prefeito Sandro Mabel e os vereadores tem gerado embates e discussões que reverberam na cidade. “A Câmara lida com pautas concretas, como taxa do lixo e a reorganização de unidades de saúde. Isso gera impacto direto na vida das pessoas. Já a Alego discute temas distantes e pouco produtivos”, pontua. (Especial para O HOJE)