Bruno Goulart
O presidente Lula da Silva (PT) desembarcou em Belém no último sábado (1º), uma semana antes do início oficial da Convenção das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP30), com uma clara intenção: retomar o protagonismo político e simbólico que o caracterizou nos meses anteriores. Hospedado em um barco na capital paraense, Lula aposta na imagem de defensor do meio ambiente e da Amazônia para reocupar o centro da agenda pública. Dentro e fora do País.
A escolha de antecipar a ida a Belém, antes mesmo da chegada das delegações estrangeiras, é vista como uma tentativa de se reposicionar politicamente após perder espaço no noticiário para a megaoperação policial no Rio de Janeiro. Desde que a ofensiva das forças de segurança tomou conta dos jornais, o governo federal tem evitado se envolver diretamente no debate e preferido preservar o presidente de uma pauta sensível, capaz de gerar desgaste junto à opinião pública.
Recuo de Lula é estratégico, avalia analista
O cientista político Lehninger Mota avalia, ao O HOJE, que Lula vive um momento de “recuo estratégico”, mas que esse afastamento também tem um custo simbólico. “Foi um escorregão quando ele comentou que traficantes também são vítimas dos usuários. A fala foi interpretada como defesa do crime, quando, na verdade, ele tentava apontar a complexidade do problemal”, explicou.
A fala de Lula sobre “traficantes vítimas de usuários” gerou forte repercussão nas redes sociais e alcançou o quarto maior volume de menções ao presidente em 2025, segundo levantamento da Brandwatch. Entre janeiro e 26 de outubro, foram 213 mil publicações, com alcance estimado em 529 milhões de pessoas. O impacto, porém, foi majoritariamente negativo: 87% das postagens criticaram o presidente, enquanto apenas 13% foram favoráveis, um resultado desfavorável para quem busca a reeleição em 2026.
Tema da violência é desfavorável ao PT
Esse deslocamento do eixo de atenção do eleitor tem afetado diretamente a estratégia de comunicação do governo, que colhia bons frutos após reagir ao “tarifaço” anunciado por Donald Trump. A postura do governo ao aumento tarifário imposto pelos Estados Unidos havia projetado Lula novamente no cenário internacional e reforçou a imagem de um presidente combativo e capaz de defender o País.
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Entretanto, o episódio do Rio de Janeiro virou o jogo. O tema da violência urbana, historicamente desfavorável ao PT, voltou ao topo das prioridades nacionais e o Planalto se viu novamente em posição reativa. “O governo tem tentado não ser puxado para esse debate, mas acabou sendo. A diferença é que está sempre reagindo. O governo não toma a frente, apenas responde aos acontecimentos”, analisa Lehninger.
Segundo o cientista político, a decisão de enviar o ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, ao Rio em nome do governo foi uma estratégia para preservar o presidente. “O ministro pode ser trocado, o presidente, não. Então, o governo colocou o Lewandowski no centro da discussão. Lula, por sua vez, preferiu o silêncio, não foi às ruas, não deu entrevistas, e agora vai para COP30, onde o tema é outro”, explica.
COP30 precisa render resultados
Essa mudança de cenário, contudo, carrega riscos. Para Lehninger Mota, a COP30 precisa render resultados concretos, sob pena de a estratégia se tornar apenas simbólica. “Não basta estar lá. Quando ele for se pronunciar, precisa apresentar ações, um pacote robusto e com uma abordagem completa do que está fazendo para resolver o problema, que é grave, e nós sabemos que não será resolvido a curto prazo”, avalia.
O cientista lembra que a segurança pública é um tema de difícil manejo, mas que não pode ser negligenciado. “Há um apoio majoritário às operações no Rio, inclusive dentro das comunidades. Ser contrário a elas é dar um tiro no pé, já que estamos falando de violência”, pontua. (Especial para O HOJE)










