Bruno Goulart
A reta final de 2025 se aproxima com um desafio bilionário para o governo Lula. Segundo o 105º Relatório de Acompanhamento Fiscal (RAF) da Instituição Fiscal Independente (IFI), o País precisará de um esforço adicional de R$ 27,1 bilhões no último trimestre do ano para alcançar a meta de resultado primário zero, prevista na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO). O diagnóstico reacende o debate sobre os rumos da política econômica brasileira: entre o rigor da austeridade e a flexibilidade fiscal que favorece investimentos em políticas sociais, defendida por setores mais desenvolvimentistas.
De acordo com o relatório, o governo acumula déficit primário de R$ 100,9 bilhões até setembro. A perda de validade da Medida Provisória 1.303 (do IOF), que poderia gerar R$ 10,6 bilhões em receitas extraordinárias, agravou o quadro. Além disso, a piora no desempenho das estatais federais aumentou o risco de descumprimento da meta. A IFI estima que, mesmo com um déficit permitido de até 0,25% do PIB — cerca de R$ 31 bilhões —, o governo ainda encerraria o ano com um rombo de R$ 73,5 bilhões. Para tentar conter o desequilíbrio, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, aposta em negociações com o Congresso durante esta semana com o objetivo de aprovar projetos derivados da MP do IOF.
“Governo que gasta”
Mas o desafio vai além da matemática fiscal. Ao O HOJE, a economista Greice Fernandes avalia que a raiz do problema é estrutural: “A gente vem vendo um déficit fiscal muito elevado desde 2023, quando o governo Lula abandonou o teto de gastos e criou um arcabouço fiscal ineficiente, baseado em arrecadação — uma receita duvidosa em um país com uma das maiores cargas tributárias do mundo”. Para a economista, a combinação entre alta da Selic, pressão inflacionária e gastos crescentes compõe um cenário de fragilidade. “O governo gasta como se não houvesse amanhã e o Banco Central não consegue cortar os juros. O setor produtivo está esmagado. E isso trava o crescimento.”
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Segundo a economista, o ministro Haddad fala em ajuste fiscal, mas não explica de onde virão os recursos. Critica ainda o que chama de “viés populista” da gestão petista, ao citar a proposta de zerar tarifas do transporte público e o empréstimo de R$ 20 bilhões aos Correios como exemplos de gastos sem sustentabilidade. “O governo insiste em salvar estatais deficitárias, comprometendo o Tesouro. Isso só amplia a dívida pública e alimenta a inflação. O risco é uma recessão”, alerta.
“Previsões exageradas”
Entretanto, a leitura fiscalista não é consenso. O cientista político, professor da Universidade Federal de Goiás (UFG) e coordenador do Observatório Brasileiro do Sistema Tributário, Francisco Tavares, vê exagero nas previsões da IFI. Para Tavares, as estimativas da instituição “não têm muita credibilidade” e partem de uma visão ortodoxa superada. 
“Eles seguem uma perspectiva fiscalista que não encontra respaldo nos dados empíricos. A relação dívida/PIB, por exemplo, não se relaciona diretamente com crescimento, desigualdade ou competitividade. Essa variável isolada é um mau indicador do desempenho econômico de um país. A cultura de austeridade fiscal expansionista já foi refutada empiricamente há mais de dez anos. É uma ideologia travestida de técnica”, explica Tavares.
O coordenador do Observatório Brasileiro do Sistema Tributário argumenta que o próprio crescimento econômico pode equilibrar as contas. “O estímulo à atividade econômica gera arrecadação e ajuda no cumprimento da meta. As projeções da IFI sempre partem do pressuposto de que o governo não vai conseguir, mas isso é uma hipótese conservadora demais.” Para Tavares, o foco na austeridade impede uma análise mais ampla dos efeitos do investimento público.
“Um déficit não gera, por si só, consequências graves”
Mesmo que o governo não alcance o resultado primário zero, o professor da UFG minimiza os impactos. “Um déficit não gera, por si só, consequências macroeconômicas graves. Em 2020 e 2021, tivemos déficits gigantes por causa da pandemia e isso não provocou colapso econômico. O importante é manter o crescimento e a capacidade do Estado de investir”, pontua Tavares. (Especial para O HOJE)











