Bruno Goulart
Coerência. Essa é a palavra que o deputado estadual Delegado Eduardo Prado (PL) mais repete ao longo da entrevista concedida ao jornalista Wilson Silvestre, no quadro Momento Político, do O HOJE. Autodeclarado membro de uma oposição “propositiva e pontual”, Prado relata em detalhes sua ruptura com o governador Ronaldo Caiado (UB), o que classifica como uma consequência de sua fidelidade às convicções, especialmente no que se refere à defesa dos servidores públicos.
“Na vida pública, temos que ter coerência. Ruim é parlamentar que muda de lado de acordo com o vento. Talvez esse seja o motivo do sucesso do nosso mandato”, afirma. Delegado de Polícia e atualmente em seu segundo mandato na Assembleia Legislativa de Goiás, Eduardo Prado conta que ingressou na base do governo Caiado em seu primeiro mandato por acreditar no projeto. No entanto, ao confrontar reformas consideradas prejudiciais ao funcionalismo, como a da previdência estadual, pediu ao próprio governador liberdade de voto.
“Falei com ele: governador, eu não posso votar contra os servidores, o agro e meus princípios cristãos. Se for para isso, é melhor eu continuar como delegado. E ele me deu carta branca”, relembra. Segundo o parlamentar, no dia seguinte, foi “expulso pelos jornais” da base governista — e nunca mais recebeu um telefonema de Caiado. “Fui expulso por manter a coerência”, resume.
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A partir desse rompimento, Prado se consolidou como um dos mais vocais opositores ao atual governo. Critica com ênfase a política fiscal, as obras inacabadas, a crise na saúde e a gestão dos recursos do Fundeinfra — fundo criado com taxação do agro, que ele diz ser uma “traição” de Caiado ao setor que ajudou a elegê-lo. “O governador prometeu que não taxaria o agro e depois criou o Fundeinfra. E ainda quer pegar os R$ 5 bilhões arrecadados para repassar a uma entidade criada sob medida, com empresas escolhidas a dedo, sem licitação.”
“Deputado independente paga caro”
A entrevista também revela bastidores da relação entre o Executivo estadual e o Parlamento goiano. Eduardo Prado denuncia retaliações e corte de emendas por sua postura independente, ao apontar que até prefeitos e vereadores aliados são pressionados a se afastar dele. “Ser independente tem um preço alto. Eu poderia ter negociado, mas preferi manter meus princípios. Prefeitos que me apoiam sofrem retaliações. Deputados da base já me aplaudiram de pé — mas não têm coragem de falar publicamente.”
Mesmo diante das dificuldades, o deputado diz manter sua base eleitoral sólida, sobretudo por sua atuação na segurança pública e na defesa dos servidores. “Eu tenho profissão. Sou delegado. Se perder a eleição, volto para minha carreira com tranquilidade. Mas enquanto for deputado, não abandono minhas convicções.”
STF e Bolsonaro
“É inconcebível dentro do princípio processual penal brasileiro, uma pessoa investigar, denunciar e julgar”, disse sobre condução de Moraes no caso Bolsonaro”. Foto: Welder Borges/O HOJE
No cenário nacional, Prado fez duras críticas ao Supremo Tribunal Federal (STF), especialmente ao ministro Alexandre de Moraes, que, segundo ele, atua fora dos limites constitucionais. “Eu estudei pelos livros do Alexandre de Moraes na faculdade. Parece que ele rasgou os próprios livros.”
Prado denuncia abusos do sistema judiciário no tratamento de figuras da direita, especialmente o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), e afirma que “a pessoa investiga, denuncia e julga — tudo ao mesmo tempo”, o que viola o devido processo legal. “Não é possível que pessoas perigosas saiam da cadeia por excesso de prazo e outros fiquem presos sem nem inquérito.”
Apesar de reconhecer a dificuldade jurídica de Bolsonaro reverter sua inelegibilidade, o deputado diz acreditar que Tarcísio de Freitas (Republicanos-SP) é o nome mais viável da direita para enfrentar Lula em 2026. “O governador Caiado não sai dos 3%. Só Tarcísio tem musculatura para vencer.”
Segundo Prado, o próprio Caiado sabotaria a direita em Goiás ao perseguir parlamentares do PL e se aliar ao PT em ações judiciais. “Ele persegue deputados do nosso partido e ainda tenta posar como nome da direita. Isso é incoerência.”
Outro alvo recorrente na entrevista é a gestão da saúde pública em Goiás. O deputado relata caos nos hospitais e dificuldades diárias para obter vagas de UTI. “Nesse exato momento, tenho 30 pessoas pedindo vaga em UTI no meu telefone. Preciso mobilizar meu gabinete para garantir acesso à saúde via mandado de segurança.”
Para o deputado, o governo goiano vive de “marketing de obras do passado” e não consegue tirar do papel projetos relevantes. “O governador tenta driblar a legislação para executar obras, enquanto outros Estados seguem a lei e entregam resultado.”
Sobre Sandro Mabel
Questionado sobre a gestão do prefeito de Goiânia, Sandro Mabel (UB), Prado pondera que vê boa vontade, mas ainda falta entrega. “Pegou uma prefeitura problemática, com rombos deixados por Rogério Cruz e com muitos compromissos com vereadores.”
Apesar disso, o deputado afirma que tem tentado contribuir: já destinou cerca de R$ 4 milhões em emendas para a educação, além de dialogar diretamente com o prefeito para ações sociais e estruturantes. “Sou um dos mais votados em Goiânia e tenho a obrigação de contribuir.”
Contudo, faz um alerta: “Os primeiros meses não foram satisfatórios. Vai precisar saber gerir a Câmara e entregar resultados à altura”.
“Sempre fui movido pelo compromisso com a justiça”
Natural de Goiânia e oriundo de uma família de servidores concursados, o deputado acumula mais de duas décadas de experiência na vida pública. Ao O HOJE, Prado ainda resgatou momentos marcantes da sua trajetória, desde os primeiros passos na Polícia Civil até a chegada à Assembleia Legislativa de Goiás.
“Passei no concurso de delegado em 2002, com apenas 23 anos. Fui o mais jovem do Brasil na época”, lembra. A primeira lotação foi em Alvorada do Norte, no Nordeste goiano, onde atuou em sete cidades diferentes. “Foi um período de combate intenso ao tráfico de drogas, muitas vezes enfrentando situações com pouco efetivo e estrutura precária.”
O retorno a Goiânia veio com o comando do 22º Distrito Policial e, posteriormente, a transferência para a Delegacia de Repressão a Narcóticos (Denarc), onde coordenou operações de grande repercussão, como a prisão de traficantes conhecidos e apreensões recordes de entorpecentes. Também integrou a força-tarefa que desvendou os crimes do serial killer mais famoso de Goiás, Tiago Henrique. “Depois disso, fui convidado a dar palestras até fora do País”, contou.
Na Delegacia do Consumidor (Decon), intensificou o combate à adulteração de combustíveis, venda clandestina de gás e alimentos vencidos. Apesar da forte atuação técnica, foi em 2016 que aceitou entrar na política, a pedido do pai, ex-vereador. “Fiz campanha com R$ 15 mil e fui eleito vereador com quase 5 mil votos.”
Na Câmara de Goiânia, presidiu a CPI do Transporte e liderou a oposição ao aumento do IPTU. Foi eleito duas vezes o melhor vereador pelo Clube dos Repórteres Políticos. Em 2018, foi para a Alego, onde segue em seu segundo mandato. “Sempre fui movido pelo compromisso com a verdade, com a justiça e com o povo de Goiás.” (Especial para O HOJE)
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