Bruno Goulart
A proposta que concede isenção de Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil mensais (PL 1.087/2025) enfrenta um cenário político congestionado na Câmara dos Deputados. Após uma semana marcada por motim que paralisou os trabalhos, mobilização pelo chamado “efeito Felca” — série de projetos contra a adultização infantil — e a tramitação da Medida Provisória do tarifaço, considerada prioridade pelo presidente da Casa, Hugo Motta (Republicanos-PB), parlamentares e analistas divergem sobre o ritmo e a viabilidade da votação ainda neste semestre.
Segundo Motta, a proposta tem ambiente favorável, pois o relatório de Arthur Lira (PP-AL) foi aprovado por unanimidade. O presidente da Câmara afirma que o texto pode ser pautado “nos próximos dias” e reitera que o tema é prioridade na Casa. O projeto enviado pelo governo eleva para R$ 5 mil a faixa de renda que terá isenção total do IR e até R$ 7.350 com redução parcial. Se aprovado, seguirá para o Senado.
No entanto, para o deputado federal Ismael Alexandrino (PSD), ouvido pelo O HOJE, a pauta do IR terá de dividir espaço com outras discussões de peso. “Imagino que, nos próximos dias, voltará à pauta a questão do Imposto de Renda, bem como a do ‘efeito Felca’, que trata da adultização infantil e da pedofilia em redes sociais. Acho que esses dois temas não vão prejudicar necessariamente outras discussões como foro privilegiado e anistia, mas a deliberação depende do presidente da Câmara”, afirmou.
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Alexandrino defende que o debate sobre foro encontre um equilíbrio, com o STJ responsável pelos julgamentos e que o STF atue apenas em questões constitucionais. Sobre a anistia, o parlamentar do PSD diz acreditar que, se avançar, será com filtros e não de forma ampla.
Já para o historiador Tiago Zancopé, especialista em políticas públicas, o momento não é propício para votar a isenção. “Pelos próximos meses, não há espaço para articular a votação da reforma do IR. O foco agora está em impedir a monetização de conteúdos que explorem crianças e adolescentes. É um tema de extrema importância, mas que, quando surge de forma rápida, tende a ter efeito midiático efêmero. Isso não constrói política pública duradoura”, analisou. Zancopé ressalta que a mudança no IR impacta milhões de brasileiros de forma permanente, mas perde apelo fora do período de declaração, o que dificulta concorrer com pautas de forte carga emocional e imediata repercussão.
Outras pautas
O contexto político agrava a disputa por espaço na agenda. O motim da semana passada, protagonizado por parlamentares da extrema direita, travou o funcionamento do Congresso e reacendeu debates como o da anistia aos envolvidos nos atos golpistas de 8 de janeiro, o fim do foro privilegiado e pedidos de impeachment do ministro Alexandre de Moraes, do STF. Paralelamente, Hugo Motta disse que vai criar um grupo de trabalho para propor medidas de proteção à infância na internet e definiu a criação de uma comissão geral para discutir o tema com mais de 60 projetos em tramitação.
Além disso, a MP do tarifaço, editada pelo governo Lula para liberar R$ 30 bilhões em crédito a exportadores afetados pelas tarifas impostas por Donald Trump, também ganhou prioridade. Motta defendeu que a resposta à medida seja rápida e que “causas como essa transcendam preferências partidárias”.
Diante desse quadro, a tramitação da isenção do IR se vê comprimida entre pautas urgentes, mobilizações políticas e disputas de capital eleitoral. Para seus defensores, é hora de avançar. Para os críticos, o risco é que uma agenda emocional e de curto prazo possa empurrar para depois uma medida de impacto econômico e social duradouro. (Especial para O HOJE)
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