Bruno Goulart
A Confederação Brasileira de Futebol (CBF) e a Nike preparam uma revolução nos uniformes da seleção brasileira para a Copa do Mundo de 2026: a tradicional segunda camisa azul será substituída por um modelo vermelho, com a marca Jordan no lugar do “swoosh” da Nike. A mudança, ainda não oficialmente confirmada pela entidade, já reacendeu um debate que transcende o esporte: a politização das cores nacionais e a batalha simbólica pelo significado da seleção brasileira.
Como é de conhecimento de todos, nos últimos anos, a camisa amarela da seleção foi apropriada pela direita como um símbolo de patriotismo, especialmente durante os governos Bolsonaro e as manifestações pró-impeachment em 2016. “A primeira camisa da seleção (amarela), pentacampeã, foi usada como instrumento político pela direita. Ela foi convertida em um símbolo de nacionalismo, muitas vezes associado a um projeto político específico”, explica Felipe Fulquim, especialista em marketing político, ao O HOJE. Essa associação criou um paradoxo: vestir o amarelo passou a ser interpretado como uma declaração ideológica, mesmo para quem não se identifica com tais grupos.
Leia mais: Federação do União Brasil e Progressistas nasce como a maior força política do Brasil
Agora, a introdução do vermelho — cor historicamente ligada à esquerda, especialmente a movimentos socialistas e comunistas — levanta a questão: haverá uma reapropriação pela esquerda? Fulquim é cético: “Não sei se a esquerda aderiria naturalmente a esse movimento. A CBF é uma entidade malquista (por conta da baixa performance e escândalos), e há um resquício histórico de resistência, já que a seleção foi usada como propaganda durante a ditadura, como em 1970”. Ele também destaca que a camisa vermelha pode ser rejeitada por parte da população que já enxerga a seleção com desconfiança, seja por péssimos resultados no futebol ou pela gestão da CBF, alvo de críticas por corrupção e má administração.
A Seleção como arena política
A politização do futebol não é nova. Desde os anos 1930, governos usaram a seleção como ferramenta de união nacional ou da política de “pão e circo”. Getúlio Vargas promoveu transmissões de rádio dos jogos para criar identidade nacional; a ditadura militar celebrou o tricampeonato de 1970 como vitória do regime. Hoje, porém, a polarização transformou a camisa em um campo de batalha.
Bolsonaristas já criticam a mudança — como, por exemplo, o deputado estadual Amauri Ribeiro (UB), que chamou a proposta de “desrespeitosa” e associou o vermelho ao comunismo. “Querem mudar a cor da seleção brasileira para vermelha. Sabemos que quem dá a estrutura para o grupo é o governo federal. O Brasil é conhecido por sua bandeira verde e amarela. Nossa bandeira jamais será vermelha”, disse durante sessão plenária desta terça-feira (29), na Alego.
Se por um lado o vermelho é uma cor identitária para a esquerda, o amarelo também se tornou. Mas outro ponto levantado por Fulquim é o interesse econômico por trás disso. “Enxergo, também, nesse movimento como uma questão até estratégica por parte da CBF para ganhar mais dinheiro. Você lança uma camiseta que agrada os dois lados”, pontua. Além disso, ele cita os brasileiros que fogem do espectro político esquerda – direita. Para ele, cidadãos desse perfil reconsideram o uso da camisa amarela por conta da polarização e da apropriação instaurada. “Você vestir a camisa da seleção brasileira, pode representar que você é de direita mesmo você não sendo”, finaliza.
Se a camisa amarela foi sequestrada pela direita, a vermelha pode sofrer o mesmo destino inverso — ou ser rejeitada por ambos os lados. “O futebol deveria ser um espaço de união, mas hoje é mais um espelho da nossa divisão”, conclui Fulquim. Enquanto isso, a torcida aguarda para ver se, em 2026, o Brasil usará de vermelho — e qual bandeira política vestirá junto.