Antes de entrar no tema do tratamento para o crime organizado, vamos tratar de outro, o hediondo. A tese, internacionalmente aceita, é que o autor de determinados tipos de delitos não tem recuperação. Um dono de boca de fumo, o ladrão habitual, o traficante de drogas ou armas – qual a possibilidade de esses “profissionais” arrumarem um emprego de carteira assinada ganhando por mês o que no crime tiram num dia? Ou de montar uma mercearia e ficar o dia inteiro lá aguentando fiscal, pagando imposto, sofrendo com a CLT, rezando contra assalto e lucrando 3%? Estuprador também não deixa de cometer crime contra a dignidade sexual. Nunca. Se ficar preso durante 6 anos (a pena máxima são 10, mas ninguém cumpre tudo), quando for solto vai violentar alguém na primeira oportunidade. A única maneira de esses monstros se aposentarem é recebendo a resposta dura do Estado via algema ou munição de fuzil, da mesma forma que eles tratam suas vítimas.
Desde 1990 existe uma lei, a 8.072, cumprida pelas autoridades só nas partes que lhes interessam. O artigo 3º, por exemplo, é ficção: “A União manterá estabelecimentos penais, de segurança máxima, destinados ao cumprimento de penas impostas a condenados de alta periculosidade, cuja permanência em presídios estaduais ponha em risco a ordem ou incolumidade pública”. O 2º foi desmentido pelo presidente da República há poucos dias: “Os crimes hediondos, a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins e o terrorismo são insuscetíveis de: I – anistia, graça e indulto; II – fiança”. Poema de amor mesmo é o 1º, pega a visão.
O artigo 1º já nasceu longo e a cada ano, inclusive neste, vai ganhando corpo. Especifica quais são os crimes hediondos. Para resumir, são o homicídio qualificado e o praticado por grupo de extermínio, o feminicídio, a lesão corporal contra integrantes das forças de segurança ou seus parentes, estupro (inclusive o de vulnerável), assalto a mão armada, sequestro, latrocínio (quando o bandido mata para roubar), extorsão mediante sequestro, comércio ilegal de armas de fogo, organização criminosa direcionada a praticar crime hediondo ou equiparado, ferir alguém em instituição de ensino e trocentos outros.
Quem se sustenta com esses delitos, até se orgulha deles e se exibe com as armas usadas para cometê-los, dificilmente se regenera. Se a Polícia, em vez de agir, esperar que os componentes de facções se tornem honestos, quantos trabalhadores vão ter a vida atrapalhada ou tirada? A Constituição da República, mais divorciada do País que a água do óleo, impede a aplicação de penas de morte (salvo em caso de guerra declarada), de caráter perpétuo, de trabalhos forçados, de banimento ou cruéis. Isso os políticos, inclusive os do Supremo Tribunal Federal, obedecem e rejeitam por inconstitucionalidade os projetos para implantá-las. Só que no inciso seguinte do mesmo artigo 5º diz que “a pena será cumprida em estabelecimentos distintos, de acordo com a natureza do delito, a idade e o sexo do apenado”. Quem obedece? Ninguém.
O problema é que a pena de morte existe na prática e estão aí os que tombam na violência todos os dias. Existe também a perpétua, cumprida pelos moradores das grandes cidades sitiadas pelas máfias. E igualmente a de banimento: as facções exigem que habitantes troquem de Estado e a outra alternativa é aquela inconstitucional, a pena de morte. O bandido pode aplicá-la. O policial, mesmo reagindo à possibilidade real de ser assassinado por criminosos, responde na dureza das leis quando atinge quem quer matá-lo – foi o caso desta terça-feira nos complexos do Alemão e da Penha.
Agora, vamos voltar para cá. Em menor grau, já houve por aqui a reação dura da Polícia à ação dos marginais. Em 2021, cerca de 30 faccionados vieram de São Paulo para agir no interior de Goiás. A inteligência policial descobriu e foi à chácara que haviam alugado, em Araçu, na Grande Goiânia. Oito bandidos estavam lá e reagiram à abordagem. Não sobrou um vivo. Os demais escaparam por não terem chegado a tempo.
O mesmo foi feito com os roubos de veículos. Eram tantos que aumentavam o seguro dos automóveis. Não houve jeito: foram localizados, trocaram tiro, morreram e agora as seguradoras dão desconto se o motorista circular em Goiás. Eis o tratamento certo para o crime organizado. E seus próprios integrantes respeitam. Eles não gostam de polícia corrupta ou covarde, mas sabem que o jogo é esse. A outra opção é enxugar gelo – aliás, o crime organizado tem a exclusividade da venda de gelo, gás, internet, passagens para andar de moto…
Chefes de facção especulam em bolsa e são ricos
É tiro e queda (opa!), basta uma operação policial dar certo para sociólogos e cientistas de esquerda erguerem o queixo para apontar os culpados: a Polícia, o Estado, a desigualdade social, a falta de oportunidades, o racismo, blá-blá-blá. Foi o caso agora na mata usada como rota de fuga pelos bandidos dos complexos do Alemão e da Penha. Era noite. Os marginais usavam vestimentas de combate. Havia, claro, as árvores. Como a Polícia poderia distinguir a etnia ou a classe social de quem estava atirando de fuzil contra os agentes?
Jovens que escolheram violar as leis tiveram as mesmas chances de seus colegas que sofrem diariamente as agruras comuns de quem busca o crescimento: frequentar escola, encontrar emprego, fazer tudo para sobrar um dinheiro para a prestação da moto, tênis novo só quando receber o 13º, rotina regrada. Às vezes, mesmo depois de vencer na vida, o morador da comunidade continua ali, convivendo com a marginalidade sem se misturar. Mas esse obediente à lei não vai colocar pistolas na cintura e pendurar fuzil no ombro para enfrentar a polícia numa floresta da favela.
Para alcançar o nível de máfias, as organizações criminosas de Rio e São Paulo subverteram até algumas religiões. Existe uma facção inteira formada somente por evangélicos, que inclusive abomina os cultos afros. O presidente da República e alguns de seus ministros se vangloriam da operação feita na Faria Lima, a via paulista dos bancos, para perseguir o dinheiro do Primeiro Comando da Capital. As ações não são excludentes: é preciso ir atrás dos recursos que os bandidos têm no Brasil e no exterior, fechar seus negócios lícitos abertos com dinheiro sujo e também ir atrás para prender quem não está ali no asfalto. Quando a Polícia Federal foi à Faria Lima, por exemplo, não conseguiu capturar qualquer integrante do PCC. A PM e a Civil do Rio de Janeiro fizeram a sua parte, também altamente necessária: enfrentaram o crime de peito aberto, reagiram à agressão armada, prenderam quem preferiu se render, levaram tiro e mandaram para a vala quem optou por medir forças. (Especial para O HOJE)










