Com a chegada das baixas temperaturas, sorveterias em todo o país enfrentam queda no consumo e buscam alternativas para manter o faturamento. No Brasil, onde o sorvete ainda é encarado majoritariamente como uma sobremesa típica do verão, o desafio da sazonalidade se impõe com mais força. Segundo dados da Associação Brasileira do Sorvete (Abrasorvete), as vendas podem recuar até 70% durante os meses frios, especialmente nas regiões Sul e Sudeste.
Enquanto países da Europa e os Estados Unidos mantêm o consumo regular de sorvete durante todo o ano, mesmo com invernos rigorosos, no Brasil a percepção cultural dificulta essa estabilidade. Isso se deve, em parte, à crença de que alimentos gelados contribuem para doenças respiratórias, ideia que não encontra respaldo científico. A Associação Brasileira das Indústrias e do Setor de Sorvetes (ABIS) reforça que gripes e resfriados são causados por vírus e que o consumo de sorvetes não agrava quadros clínicos.
Diante desse cenário, sorveterias adotam medidas para adaptar seus negócios à estação e garantir a permanência dos clientes.
Cardápio adaptado e foco em receitas sazonais
Para estimular o consumo no frio, empresários do setor têm apostado em sabores mais associados ao inverno. Chocolate quente, cappuccino, canela, nozes, castanhas e paçoca são alguns dos ingredientes que vêm sendo incorporados às receitas. Além disso, combinações com sobremesas quentes, como petit gâteau, brownies e waffles, vêm ganhando espaço nos cardápios.
Na Pine.Co, rede com duas unidades em São Paulo, os irmãos Daniel e Raphael Lee começaram a oferecer cookies, biscoitos e brownies de forma avulsa, produtos que antes serviam apenas como acompanhamentos. Em datas comemorativas, como as festas juninas, a aposta recai sobre pratos típicos com nova apresentação. A canjica quente com sorvete de paçoca, por exemplo, foi criada para manter o apelo comercial durante o mês de junho.
As cafeterias também servem de inspiração para as sorveterias. A rede Rochinha, presente em quatro estados brasileiros, iniciou uma reestruturação em suas lojas. O objetivo é oferecer ambientes mais confortáveis e propícios para o inverno. Iluminação suave, tons neutros e materiais naturais compõem o novo projeto arquitetônico das unidades, que passaram a adotar o nome “Cremeria do Brasil”.
Ambientes aconchegantes e novos canais de venda
Além da diversificação no cardápio, mudanças estruturais também têm sido adotadas para atrair o público. Ambientes antes decorados com temas tropicais agora ganham características de conforto e acolhimento. Espaços internos climatizados, mantas sobre os assentos e iluminação indireta são alguns dos elementos introduzidos para que o consumidor se sinta à vontade para permanecer no local mesmo durante o frio.
Porém, para os pequenos empreendedores que não conseguem arcar com reformas, outras saídas têm se mostrado eficazes. A ampliação dos serviços de delivery e take away é uma delas. Para isso, é necessário investir em embalagens adequadas para transporte de produtos gelados e estabelecer canais de atendimento que facilitem os pedidos, como aplicativos de entrega, WhatsApp e telefone.
O presidente da ABIS, Eduardo Weisberg, destaca a importância de ouvir os consumidores. Segundo ele, o sucesso está em “entender o que o cliente procura e sempre surpreendê-lo”.
Sorveterias apostam em receitas com castanhas, paçoca e chocolate quente. Foto: Divulgação
Promoções, fidelização e marketing digital das sorveterias
Oferecer descontos e criar promoções são estratégias antigas, mas que ainda funcionam bem. Durante o inverno, sorveterias podem adotar a lógica do “sabor do dia”, com preços especiais para sabores específicos. Outras ações incluem brindes, sorteios, pacotes para famílias e programas de fidelidade que premiam a frequência dos consumidores.
A comunicação, especialmente nas redes sociais, é parte crucial dessas ações. Mesmo que o cliente não pense espontaneamente em consumir sorvete no frio, ele está exposto aos conteúdos digitais. Postagens com sugestões de consumo, vídeos mostrando os novos sabores e campanhas com foco no apelo saudável do sorvete são algumas das possibilidades exploradas.
Cristina Ambiel, professora do Senai de São Paulo, lembra que muitos sorvetes são enriquecidos com vitaminas, fibras e minerais. Para ela, essa característica deve ser destacada nas campanhas. “É preciso explorar os aspectos saudáveis do sorvete”, afirma.
O estudo “O sorvete quer falar”, realizado pela Abrasorvete em 2024, mostra que 56,7% dos empreendedores veem a sazonalidade como o maior desafio do setor. E, entre as empresas entrevistadas, 46% são microempresas, as mais impactadas pela queda nas vendas de maio a agosto.
Por isso, a orientação dos especialistas é clara: entender o consumidor e adaptar a oferta são medidas que, quando bem planejadas, garantem não apenas a sobrevivência do negócio, mas também a fidelização do público.