A instalação de grama sintética em canteiros da Avenida Castelo Branco, no Setor Coimbra, e também na Rua 44, em Goiânia, no dia 18 de agosto, se transformou em motivo de debate acalorado entre moradores, comerciantes e especialistas.
De um lado, há quem veja a iniciativa como modernização do espaço urbano, garantindo aparência verde mesmo em períodos de estiagem. De outro, surgem críticas pelo alto custo, ausência de benefícios ambientais e pelo efeito de artificialização da paisagem.
A insatisfação de parte da população ficou evidente nas redes sociais. Em comentário na página do jornalista Oloares Ferreira, o morador Pedro Silva Borges classificou a ação como um “crime ambiental”. Para ele, a substituição da vegetação natural compromete funções essenciais do solo.
“Não se trata de ‘mimimi’ ambientalista. A permeabilidade do solo é fundamental para absorção das águas pluviais. Além disso, nada substitui a beleza da vegetação natural. O resultado é poluição visual, aumento da temperatura e prejuízos à relação com o meio ambiente”, desabafou.
A reportagem esteve no local acompanhada do urbanista Fred Le Blue Assis, que analisou os impactos da medida e não poupou críticas. Para ele, a instalação da grama sintética representa um retrocesso no planejamento urbano da Capital.
“É natural que a grama fique seca durante a estiagem. Essa mudança de cor faz parte do ciclo das estações e nos ajuda a internalizar a relação com a natureza. Se não cuidamos do pequeno, dificilmente cuidaremos do macro. Substituí-la por plástico é um erro que pode custar caro no futuro”, afirmou.
Fred ressalta que, embora a grama artificial garanta aspecto sempre verde, ela rompe com a lógica ecológica que marcou a identidade de Goiânia como “Capital Verde”.
“Trocar a grama natural pela sintética como um projeto de cidade é preocupante. Isso desambientaliza as pessoas, cria uma estética de shopping center nas ruas e abre espaço para uma lógica privatizante do espaço público. Goiânia sempre foi referência ecológica. Se naturalizarmos esse tipo de intervenção, estaremos caminhando para uma cidade cafona e desconectada do meio ambiente”, criticou.
Impactos ambientais, riscos sanitários e perda da identidade urbana
Entre os pontos mais preocupantes, segundo o urbanista, está o impacto da medida sobre o sistema de drenagem urbana. “Diferente da vegetação natural, a grama sintética não possui raízes que auxiliam na infiltração da água da chuva. Ela até retém um pouco de líquido, mas não substitui a grama natural. Em chuvas mais fortes, pode encharcar e escoar para o asfalto, aumentando riscos de alagamentos”, explicou.
Além do problema com o escoamento da água, Fred também alertou para riscos sanitários: “Se a grama sintética não tiver furos em sua extensão, haverá acúmulo de água, mesmo em chuvas leves, porque o material é impermeável. Nesse sentido, além de favorecer enchentes por falhas de drenagem urbana, ela pode se tornar um criadouro de mosquitos da dengue”, advertiu.
Outro aspecto destacado pelo especialista foi a perda da estética natural e a alteração da percepção da população sobre o espaço público. “A grama, por menor que pareça, é um símbolo do meio ambiente. A cor que muda com as estações nos conecta à natureza. Retirar isso em troca de plástico é como trocar uma identidade viva por uma fachada artificial. A cidade perde em qualidade de vida e em identidade cultural”, avaliou.
Fred reconhece que o uso do material pode ter aplicações positivas em outros contextos urbanos, especialmente em áreas de terra batida. “Nesses locais, onde o excesso de poeira prejudica moradores e comerciantes, a grama artificial poderia reduzir os transtornos e trazer benefícios reais. Mas, no lugar da grama natural, em avenidas e espaços consolidados, a substituição é um equívoco”, ponderou.
Para ele, Goiânia deveria apostar em políticas já testadas e reconhecidas. “Precisamos recuperar projetos bem-sucedidos do passado, como o plano de drenagem urbana e o Arboriza Gyn, em vez de retroceder em conquistas ambientais”, defendeu.
Com a novidade implantada em dois pontos estratégicos da Capital, o debate promete se intensificar. Enquanto a prefeitura aponta economia de manutenção e modernização estética, urbanistas e parte da população questionam os impactos ambientais e sociais.
Para Fred, a questão vai além de custo e aparência. “O que está em jogo é o modelo de cidade que queremos construir. Uma Goiânia conectada à sua vocação verde ou uma metrópole artificializada, impermeável e suscetível a problemas urbanos e sanitários”, concluiu.
O post “Substituir grama natural por plástico é um erro que pode custar caro”, alerta urbanista sobre grama sintética apareceu primeiro em O Hoje.