A Secretaria de Estado da Segurança Pública de Goiás (SSP-GO) divulgou recentemente que o estado de Goiás registrou, em junho de 2025, o menor número de homicídios desde 2016, ano em que foi implantada a atual metodologia de monitoramento e análise de dados. Segundo o Observatório da SSP-GO, foram contabilizados apenas 54 homicídios em todo o território goiano no mês, reforçando a tendência de queda contínua nos índices de violência letal.
A metodologia de acompanhamento utiliza a plataforma Qlik Sense, por meio do sistema RAI (Responsabilidade, Ação e Integração), ferramenta que permite o monitoramento em tempo real dos crimes violentos, incluindo feminicídios nos indicadores de homicídios. O desempenho é resultado de investimentos em tecnologia, capacitação e ações estratégicas, como o aumento de operações preventivas e ostensivas em áreas críticas.
Entretanto, apesar do progresso evidente na redução da letalidade, outros tipos de violência vêm ganhando espaço de forma preocupante no estado. Segundo o 19º Anuário Brasileiro de Segurança Pública, publicado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, Goiás enfrenta uma escalada nos casos de violência sexual, com destaque negativo para seis municípios situados na região nordeste do estado, próxima à Chapada dos Veadeiros área turística que, apesar do fluxo de visitantes, sofre com a ausência de infraestrutura básica.
Entre as 50 cidades brasileiras com as piores taxas de estupro por 100 mil habitantes em 2024, estão Cavalcante (6ª posição, com 456,5), Campos Belos (19ª, com 229,5), Alto Paraíso de Goiás (23ª, com 211,8), Posse (32ª, com 181,2), São Domingos (34ª, com 178,8) e Formosa (40ª, com 170,9). O dado chama atenção para a precariedade na proteção às vítimas, especialmente pela falta de delegacias especializadas, serviços de acolhimento e políticas públicas de enfrentamento à violência sexual.
Para o consultor de segurança Franceildo dos Santos, o cenário da violência sexual é agravado por uma cultura do silêncio que ainda impera em muitos casos. “Infelizmente, esses crimes são cometidos, em grande parte, dentro de contextos domésticos. Há uma série de fatores que contribuem para que as vítimas não denunciem, como ameaças, dependência emocional ou econômica em relação ao agressor. Muitas vezes, quando a denúncia chega, o crime já vem ocorrendo há bastante tempo, o que torna a situação ainda mais complexa”, explica.
O especialista destaca que é preciso romper essa barreira com políticas públicas efetivas e uma rede de apoio robusta. “É necessário oferecer condições reais para que a vítima e sua família consiga denunciar, com segurança e acolhimento. Ter delegacias é importante, mas não basta. É fundamental garantir atendimento psicológico e estruturar políticas claras que impeçam que o agressor volte a praticar o crime. Isso exige atuação firme dos poderes públicos e dos nossos legisladores.”
A comparação entre a queda nos homicídios e o aumento dos casos de estupro evidencia uma assimetria nas políticas de segurança: embora a criminalidade letal tenha sido contida, a segurança de mulheres, crianças e adolescentes permanece vulnerável. O anuário também aponta que, em 2024, o Brasil registrou 87.545 casos de estupro, número 19% superior ao ano anterior. Em 76,8% dos casos, as vítimas foram consideradas vulneráveis, sobretudo crianças e adolescentes.
Além da alta incidência, a maior parte dos crimes sexuais ocorre em contextos familiares ou entre conhecidos da vítima, o que dificulta ainda mais a denúncia e exige políticas públicas específicas. Em localidades com pouca estrutura, como as citadas na pesquisa, a subnotificação tende a ser elevada, indicando que os números oficiais podem representar apenas uma parte do problema real.
Outro dado que merece destaque é o comportamento dos feminicídios. Embora incluídos no total de homicídios, esses crimes não apresentaram a mesma tendência de queda. Isso reforça a persistência da violência de gênero como um desafio estrutural. Mesmo com os avanços tecnológicos e operacionais no combate ao crime, ainda há lacunas significativas na proteção de mulheres em situação de vulnerabilidade.
A presença de municípios goianos entre os piores do país em violência sexual revela um desequilíbrio preocupante nas políticas públicas estaduais. Enquanto os índices de homicídios vêm despencando, o avanço da violência sexual escancara a falta de uma estratégia articulada para enfrentar esse tipo de crime, especialmente em regiões afastadas dos grandes centros urbanos.
A situação exige respostas urgentes e integradas, que vão além da repressão. É necessário fortalecer redes de proteção social, investir em atendimento especializado, garantir acesso à justiça e promover campanhas permanentes de conscientização. A segurança pública precisa ser ampliada em seu conceito, incluindo também a preservação da dignidade, integridade física e psicológica de todos os cidadãos — especialmente daqueles que estão em maior situação de risco.
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