O projeto Centro Universal de Referência à Assistência Animal (Curaa), desenvolvido no Instituto Federal de Urutaí (GO), é uma iniciativa social que oferece uma nova oportunidade a cães reprovados nos testes para guiar pessoas cegas. Por não atenderem a certos critérios, esses animais são redirecionados para um treinamento especializado, passando a atuar como animais de assistência emocional e terapêutica, apoiando crianças que possuem transtornos do neurodesenvolvimento, autismo e paralisia cerebral ou outras questões cognitivas ou sensoriais.
Elaine Bezerra, responsável pelo projeto explica que a ideia surgiu quando foi percebido que mesmo reprovados, esses cães continuavam com qualidades que poderiam ser aproveitadas.
“Cães que não se graduaram para cães guias continuavam com muitas qualidades, inclusive e a mais importante ao meu ver que é aptidão natural em servir, estar junto, estar pronto para quaisquer eventualidades. Visto que o público autista e outras deficiências se encontravam e se encantavam quando em contato com os cães partimos para esse objetivo com essa visão”, contou Elaine.
“Os critérios continuam padronizados, em quase todas as escolas do mundo existem alguns testes que são aplicados que verificam e atestam uma possível aptidão ao trabalho. Mas um dos critérios mais valiosos eu diria que de caráter eliminatório são traços de agressividade e reatividade. Geralmente cães com esse perfil nem saem para socializar, caso ele demonstre ser de natureza agressiva”, completou.
O treinamento parte da socialização e da sensibilização desse animal em diversos contextos e ambientes utilizando acessórios pertinentes de estímulo e percepção. Outro fator detalhado pela responsável é que o projeto não atende apenas crianças, mas também pacientes em hospitais e clínicas, casas de acolhimento e permanência de pessoas idosas.
Auxílio aos alunos
Recentemente, o Curaa em parceria com a Secretaria Estadual de Educação (Seduc) tem levado os cães para auxiliar alunos pedagogicamente de forma ativa durante os períodos de contraturno promovendo o desenvolvimento motor e sensorial de crianças em fase de alfabetização. Com coletes ajustáveis com velcro, os animais auxiliam em atividades com letras estimulando a autonomia e o crescimento sócio emocional.
“A parceria com a secretaria de Educação foi firmado após “amostras grátis” de quão transformador conseguiríamos ser dentro de um ambiente escolar. O acordo com a secretaria foi de atender alunos com transtorno do espectro autistas e deficientes intelectuais nas salas de educação especializadas e os resultados são surpreendentes. Resultados esses onde o aprendizado e a participação com coletivo foi preconizado, atenção direcionada, engajamento percebido, autocontrole e ainda com interação social e sensorial, fim da evasão escolar, entre tantos outros benefícios que se estendem não só na escola mas em casa e na sociedade”, pontuou Bezerra.
Atualmente cerca de 200 alunos da rede estadual de ensino são atendidos durante o contraturno, em que os estudantes estão na escola em atividades extracurriculares. Em clínicas são atendidas em média 18 pessoas, em relação aos hospitais Elaine relatou que esse número não é mensurável, isso porque dependendo do hospital todos os leitos e Unidade de Terapia Intensiva (UTI) são atendidos.
Ela também explicou que a principal diferença de um cão de assistência do Curaa e de um cão guia tradicional, é que os cães guias são entregues ao tutor e por enquanto, o Curaa ainda não tem esse animal para ser entregue.
“Avaliamos que o impacto é de extrema relevância onde inserimos cães e a interação com cão estimula habilidades importantes como coordenação motora, atenção, memória tudo de forma lúdica e motivadora, criamos primeiro vínculo e percebemos que quando o aluno se sente seguro e conectado com o cão o aprendizado acontece de forma natural e prazerosa”.
Cães ajudam crianças a vencer medo, ansiedade e rejeição na escola
Marciandreia é mãe do Joaquim, ela conheceu o projeto em agosto de 2024, através do Colégio Estadual Jardim Vila Boa. Após tomar conhecimento do Curaa, começou a ser trabalhada a relação entre os cães e Joaquim para ver como seria a reação do jovem, que segundo a mãe foi muito receptivo.
“Ele viu o cão como um amigo, ele fala que a (Caju) é amiga dele, um trabalho maravilhoso o desenvolvimento espetacular dessas atividades na escola com o cão no próprio ambiente escolar junto com outros colegas”, relata.
Desde então Marciandreia tem percebido melhora na concentração, demonstração de interesse para participar das atividades escolares e mais gosto para frequentar a escola. “Antes da chegada dos cães ele não gostava de ir pra escola chorava, nossa como era complicado fazer ele ir. Desde quando chegou o projeto Curaa tudo mudou, vamos dizer que tudo ficou mais colorido de uma certa forma”.
A interação com os cães ajudou o jovem em um momento de crise na escola em que estuda. Segundo a mãe, Joaquim estava agitado em sala, falando alto e nervoso, após a professora de apoio o levar para a Sala de Atendimento Educacional Especializada o rapaz se tranquilizou aos ver os cães e após isso passou a fazer atividades de motricidade. “Daí então nem parecia aquele menino nervoso muito agitado”, relata.
Andre Freiria e Graziela Blanch, são pais do Rodrigo, eles conheceram o projeto através das redes sociais. Devido ao fato de já possuírem pet em casa, os pais avaliam que a introdução foi bem tranquila devido ao fato de já existir uma rotina de cuidados com o cachorro.
“Mas o acompanhamento de perto pelo Curaa foi fundamental para que os ajustes necessários fossem realizados de maneira bem tranquila. Hoje estamos como família socializadora de um cão filhote (desde os 3 meses até agora – 11 meses) onde o Curaa acompanha a evolução do cão semanalmente e dá todo o suporte para que este trabalho de socialização seja feito da maneira mais correta possível”.
Mais calmo e tranquilo
Os dois destacam que Rodrigo tem se tornado mais calmo e tranquilo e que quando ele está próximo de ter uma crise o cão ajuda a reverter a situação. “É como se o nervosismo/irritação intenso dele fosse substituído pela graça de brincar, estar perto, ser lambido pelo cão”, relatam.
Para Rodrigo o ambiente escolar se tornou menos hostil em decorrência do cão. “A escola era o ambiente mais sensível para o Rodrigo, por ter passado um episódio de bullying no ambiente escolar. A partir da presença do cão na escola, com ele, juntamente com a Auxiliar Terapêutica, este ambiente foi se tornando cada vez menos hostil. O auxílio hoje dos cães que o acompanham é a simples presença e possibilidade de estar em contato quando ele precisar, pois os cães que o acompanham hoje são cães sem tarefas específicas para o Rodrigo. Esperamos que isso mude, pois o Curaa tem trabalhado para conseguir um cão que execute tarefas específicas para acalmá-lo.”
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