Um novo perfil de empreendedor começa a tomar forma no Brasil: aquele que dialoga com algoritmos. Dados de uma recente pesquisa nacional revelam que 44% das micro e pequenas empresas, com faturamento anual entre R$ 200 mil e R$ 3 milhões, já utilizam inteligência artificial generativa com frequência no cotidiano dos negócios. O dado representa não apenas uma adesão relevante à tecnologia, mas um sinal claro de que a IA deixou de ser tendência e passou a fazer parte da estratégia operacional de um número expressivo de empresas.
IA no dia a dia: do marketing ao atendimento ao cliente
O principal uso está concentrado em três áreas essenciais: marketing, vendas e relacionamento com clientes. Em 70% das empresas que adotam a tecnologia, ela é aplicada para automatizar comunicações, criar conteúdo, gerar leads e até responder consumidores em tempo real. A edição de imagens e vídeos aparece em segundo lugar (65%), seguida pela análise de dados (52%), mostrando a multifuncionalidade da IA generativa nas rotinas empresariais.
Para especialistas em inovação empresarial, essa movimentação representa uma transformação silenciosa no mercado. “O interesse por inovação é real e crescente. A inteligência artificial está se inserindo com naturalidade nas operações, mas ainda há um enorme potencial a ser explorado, especialmente em áreas como finanças e gestão”, avalia Nathália Porto, diretora de uma consultoria de análise de comportamento empresarial.
Soluções digitais convivem com métodos manuais
Apesar do avanço, a tecnologia ainda não substituiu os métodos tradicionais. Segundo a mesma pesquisa, 16% dos empreendedores ainda controlam as finanças do negócio manualmente, com cadernetas. Outros 23% utilizam planilhas de Excel. Apenas 28% já adotaram softwares específicos de gestão. Os principais desafios apontados na organização financeira são o controle de custos e receitas (17%) e a necessidade de orientação especializada (15%).
O grau de confiança na tecnologia, por outro lado, é moderado. Quando perguntados sobre o impacto da IA nos negócios, os empreendedores demonstraram otimismo em pontos como melhoria no atendimento (nota média de 3,8 numa escala de 1 a 5), aumento da produtividade (3,8) e controle financeiro (3,3). Já em funções mais críticas, como contratação de crédito ou movimentações bancárias, a confiança é menor — 2,9 e 3,1, respectivamente.
Tecnologia já é rotina em quase metade das pequenas empresas brasileiras
Demanda por profissionais com domínio em IA triplica
Essa evolução não ocorre isoladamente. A inteligência artificial tem moldado também o mercado de trabalho. Em áreas como marketing, publicidade, vendas, RH, logística e design, a IA generativa já é considerada diferencial competitivo. Profissionais que dominam ferramentas baseadas em IA são cada vez mais procurados por startups e empresas de tecnologia. Nos últimos dois anos, triplicou o número de vagas no Brasil que mencionam domínio de IA como requisito. No exterior, o cenário é semelhante: no Reino Unido, 3,1% de todas as vagas abertas em 2024 exigiram habilidades em IA; nos Estados Unidos, esse número saltou de 3 para 110 a cada 100 mil vagas, segundo plataformas de recrutamento.
Funções redefinidas: da automação à estratégia criativa
Na prática, a IA já automatiza processos antes restritos a equipes inteiras: geração de textos, simulações de projetos, análise de dados de mercado e até roteirização de vendas personalizadas. Esse novo cenário tem impulsionado o surgimento de um perfil profissional híbrido: pessoas com domínio técnico, mas também competências criativas, estratégicas e analíticas.
Enquanto 28% usam softwares de gestão, 39% ainda controlam finanças com planilhas ou à mão
Avanço da IA exige regulação e preparo ético
Mas a adoção acelerada também gera questionamentos. Um levantamento feito com empresas de grande porte no Brasil mostra que 76% já usam IA, sendo que 58% concentram esse uso em estratégias de comunicação. O ganho de produtividade é o principal benefício relatado (87%). Ainda assim, 56% dos entrevistados expressam preocupação com a precisão dos dados, 55% sentem falta de personalização e 49% apontam desafios éticos e jurídicos no uso da tecnologia.
Essas preocupações indicam que, embora a IA já tenha se tornado uma aliada operacional, seu uso pleno exige protocolos claros, curadoria humana e capacitação técnica constante. “A confiança na segurança dos dados e a clareza nas aplicações são fundamentais para que essa transformação seja sustentável”, resume Nathália.
O mercado de trabalho e o ambiente empresarial estão, portanto, em plena mutação. A IA generativa não elimina empregos, mas redefine funções, amplia possibilidades e obriga empresários e trabalhadores a se adaptarem rapidamente. Saber usar a tecnologia de forma ética, estratégica e integrada à realidade do negócio é o novo diferencial competitivo — e, possivelmente, a chave para sobreviver em um mercado cada vez mais automatizado, veloz e exigente.
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