Ir à academia deixou de ser uma atividade ocasional para se tornar um verdadeiro estilo de vida para milhões de brasileiros. A rotina de treinos que antes era associada a preparações sazonais, como o verão ou datas especiais, hoje se firmou como parte essencial do dia a dia de boa parte da população.
Com cerca de 35 mil academias espalhadas pelo País, o Brasil é atualmente o segundo maior mercado fitness do mundo, atrás apenas dos Estados Unidos, segundo dados da Cortex. Mais que um espaço para perder peso ou ganhar músculo, a academia também se consolidou como um ambiente de socialização, conexão e bem-estar emocional.
Estados como São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro lideram o ranking, sendo responsáveis por quase 30% de todo o mercado nacional. O crescimento não para: entre janeiro e abril de 2023, foram abertas 894 novas unidades. E isso se reflete na adesão da população à prática: cerca de 21% dos brasileiros frequentam academias. Um dado expressivo se comparado ao restante do mundo.
Esse fenômeno tem explicações que vão além da vaidade. Para 48% dos brasileiros, frequentar a academia é uma forma de aliviar o estresse e a ansiedade. Em um mundo cada vez mais digital e acelerado, o treino virou um ritual de estabilidade e autocuidado.
As academias tornaram-se espaços seguros para encontrar pessoas com interesses semelhantes e trocar experiências. É o que relata a microempresária Vanielle Ferreira, 35 anos, que frequenta academias em Goiânia:
“Hoje a academia é minha segunda casa. Vou duas vezes por dia, de manhã cedo e depois do expediente. No começo foi por necessidade mesmo. Eu estava acima do peso e não me sentia bem, tanto fisicamente quanto emocionalmente. Mas depois que perdi quase 25 quilos, me apaixonei de verdade pela musculação”, conta ela.
“Fiz amizades incríveis ali. Tenho amigos que conheci na academia e hoje são parte da minha vida. É muito bom conviver com pessoas que gostam das mesmas coisas que você.”
Crescimento econômico e impacto local
O mercado fitness também tem forte impacto econômico. Em 2024, o setor de saúde, beleza e bem-estar (que inclui academias) cresceu 16,5% em faturamento, alcançando R$ 64,8 bilhões. A maioria das academias no Brasil é composta por microempresas (72,75%), que contribuem com a economia local, gerando empregos e acessibilidade à atividade física.
Academias menores oferecem preços mais acessíveis e atendem comunidades com pouco acesso a grandes redes. Isso contribui para a inclusão e democratização da prática de exercícios.
O Estado de Goiás, por exemplo, possui 1.444 academias ativas e mais 90 em processo de implantação, segundo levantamento da Medicina S/A. A maioria está concentrada na região metropolitana de Goiânia. Em nível regional, o Sudeste lidera com mais de 13 mil academias, seguido pelo Nordeste (8.727), Sul (5.604), Centro-Oeste (3.392) e Norte (3.049). O movimento reflete uma crescente conscientização sobre a importância da saúde e o combate ao sedentarismo, impulsionado também por campanhas governamentais.
Outro aspecto importante é a influência das redes sociais no universo fitness. Mais de 62% dos brasileiros afirmam postar conteúdo relacionado a exercícios. O País está entre os cinco que mais compartilham treinos online. A academia virou palco para influenciadores, desafiando os praticantes a documentarem seus avanços e se manterem engajados.
Vanielle é uma dessas usuárias conectadas: “Sempre que posso, mesmo que seja só para os ‘melhores amigos’, gosto de postar meus treinos nas redes sociais. É uma forma de inspirar, mostrar minha evolução e dividir essa paixão. Pra mim, musculação é mais do que estética, é disciplina, autocuidado e superação.”
Aponta academias como espaços de reconexão pós-pandemia
A psicóloga Paula Ventura, reforça que a prática da atividade física vai muito além da aparência. Para ela, é essencial reconhecer o valor do movimento como ferramenta terapêutica: “Na psicologia a gente entende que a mente e o corpo não funcionam de formas separadas. O que afeta um, repercute no outro. A prática corporal, quando feita com escuta e presença, pode ser uma maneira de se reconectar consigo mesmo. A atividade física regular traz inúmeros benefícios: liberação de neurotransmissores como endorfina e serotonina, redução do estresse, da ansiedade e até da depressão. Também melhora o sono e a autoestima”, explica.
Ela observa que movimentar o corpo ajuda a descarregar tensões acumuladas por uma rotina sobrecarregada e exige atenção para os sinais internos. “A atividade física oferece uma experiência de repetição e conquista, mesmo que pequenas, que colaboram para a construção de um espaço interno mais estável. Isso tem efeitos diretos no manejo das emoções e na percepção de si.”
Outro ponto importante levantado pela especialista é o papel das interações sociais. “Um hábito envolve mais do que disciplina. A presença de amizades, grupos ou mesmo um personal pode tornar o treino mais leve e prazeroso. Entre uma repetição e outra, há troca, incentivo, risadas e construção de vínculos. Isso transforma o treino em um momento de encontro, e não só de esforço.”
A psicóloga destaca ainda a importância da individualidade. “Para algumas pessoas, o ambiente da academia é estimulante; para outras, especialmente quem tem insegurança com exposição social, pode ser desafiador. Por isso, é fundamental respeitar o tempo e a forma de cada um.”
Segundo ela, o crescimento das academias após a pandemia também reflete um desejo coletivo de reconexão. “Há muita busca por retomada, por dizer ‘estou aqui, estou vivo’. E, ao mesmo tempo, vivemos uma cultura que associa corpo, cuidado com autoestima, produtividade. As redes sociais reforçam isso com imagens de corpos idealizados. Nesse contexto, a academia também pode representar um lugar de ordem, rotina, metas e repetição. Ou seja, uma resposta subjetiva às angústias do nosso tempo.”
Com um mercado aquecido, aumento de frequentadores e forte integração digital, o futuro das academias no Brasil parece promissor. Além de centros de condicionamento físico, esses espaços consolidam-se cada vez mais como pontos de encontro, convivência e construção de autoestima.
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