A Câmara dos Deputados e o Supremo Tribunal Federal (STF) vivem um impasse difícil de ser revertido e resultar no apaziguamento de relações entre os poderes. Isso porque com a decisão da Corte em determinar a perda do mandato da deputada bolsonarista Carla Zambelli (PL-SP), parte da Casa baixa do Congresso considera a ação como algo inconstitucional.
O ministro Alexandre de Moraes fez com que o mandato da parlamentar fosse cassado diante do placar de 227 deputados que votaram a favor da perda do mandato e 110 contra, com 10 abstenções. Porém, para que a deputada perca o processo, é necessário 30 votos a mais, ou seja, 257 votos no mínimo.
Na madrugada da última quinta-feira (11), a Câmara dos Deputados votou pela manutenção do mandato de Zambelli, condenada a dez anos de prisão por invadir o sistema do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) com a ajuda do hacker Walter Delgatti Neto, que também foi condenado pela Corte.
Câmara durante votação na madrugada desta quarta-feira (10) – Créditos: Bruno Spada/Câmara dos Deputados
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Atualmente, a deputada segue presa na Itália, país onde a mesma fugiu e que, inclusive, teve de enfrentar duas decisões desfavoráveis na Justiça italiana. O Supremo Tribunal de Apelação do país desconsiderou o pedido de defesa para que a parlamentar aguardasse o processo em prisão domiciliar ou em liberdade, por avaliar que havia risco de fuga. Em outubro, a Corte de Cassação, última instância, negou recurso e manteve Zambelli no cárcere.
Posicionamento da direita sobre Zambelli
Do mesmo partido de Zambelli, a deputada federal Bia Kicis demonstra o que a direita pensa sobre a decisão de Alexandre de Moraes em relação à situação de Zambelli, mesmo após a Câmara ter sido favorável pela suspensão da cassação. “A decisão do ministro Alexandre sobre Carla Zambelli nos mostra, outra vez, um Judiciário que deixou de aplicar a lei e passou a criar sua própria lei para interferir na política”, diz Kicis em entrevista à Folha de São Paulo. “Quando um ministro substitui a Constituição por seus pensamentos, não há Justiça, há abuso de poder”, comenta a deputada.
Aliada de Zambelli, deputada federal Bia Kicis (PL-SP), critica decisão de Moraes de determinar perda de mandato da bolsonarista – Créditos: Kayo Magalhães / Câmara dos Deputados
Tal desentendimento entre o Supremo e a Câmara ocorre em um contexto de bipolarização na Casa presidida por Hugo Motta (Republicanos-PB), a considerar a decisão do mesmo em determinar a cassação de Zambelli e do deputado federal Glauber Braga (Psol-RJ), ambas no mesmo dia.
Decisão de Motta divide o centrão
Dessa forma, o presidente da Câmara colaborou para um novo racha do Centrão que, de um lado defendeu a causa do psolista e, de outro, foi contra a cassação de uma das principais figuras do bolsonarismo. Aliados de Glauber buscaram apoio de integrantes do centrão em prol da pena alternativa.
Assim, foi articulada a aprovação de uma emenda que pudesse alterar a punição de perda de mandato, o que foi defendido por parte do centro. “Não concordo com a perda de mandato. Sabemos que existe uma rivalidade, mas o parlamento é plural”, disse o deputado Fausto Pinato (PP-SP), que defendeu uma pena de suspensão de 6 meses para Braga.
Deputado federal Glauber Braga (Psol-RJ) – Créditos: Kayo Magalhães/Câmara dos Deputados
Já deputados da direita afirmaram que a Secretaria de Relações Institucionais entrou na articulação pela manutenção do mandato de Braga com a promessa de liberação mais ágil de emendas. Porém, os governistas negaram.
Durante a votação da suspensão, partidos da oposição se dividiram e o vice-líder do Partido Liberal, deputado Bibo Nunes (RS), chegou a orientar que a sigla votasse pela punição menor sob a justificativa de que eles não teriam votos para garantir a cassação. Por conta dessa ação, Nunes acabou destituído da vice-liderança pelo líder do partido, Sóstenes Cavalcante (RJ).
O pedido de abertura de procedimento contra Glauber foi apresentado após o parlamentar protagonizar embates físicos com o membro do Movimento Brasil Livre (MBL) Gabriel Costenaro e o deputado Kim Kataguiri (União-SP), um dos fundadores do movimento, em abril deste ano.
Diante do repartimento do Centrão, da interferência do STF na permanência do mandato de Zambelli e da suspensão da cassação de Glauber, o que se espera é um tensionamento ainda mais acirrado entre os poderes, sobretudo, por conta do processo das cassações que resultaram em desfecho negativo para a bolsonarista e, consideravelmente positivo para Glauber.








