Bruno Goulart
As peças do jogo eleitoral de 2026 já estão em movimento, mas o campo da direita parece jogar contra si mesmo. O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), que até pouco tempo era o nome mais sólido da direita para enfrentar Lula, agora adota um discurso de cautela. Diz que seu foco é a reeleição em São Paulo e passou a defender o governador do Paraná, Ratinho Júnior (PSD), como uma alternativa “viável” para representar o campo liberal-conservador. O recuo, que antes parecia tático, hoje soa como sintoma de um enfraquecimento mais profundo: o da própria direita como projeto unificado de poder.
A análise do jornalista Elio Gaspar sintetiza o momento. Segundo ele, o governo Lula conseguiu impor uma “agenda positiva” com medidas como a ampliação da isenção do Imposto de Renda e a recomposição de políticas sociais. Ao mesmo tempo, a oposição se perdeu “num delírio trumpista”, como se viu nas manifestações da Avenida Paulista com bandeiras dos Estados Unidos tremulando em pleno 7 de Setembro. “Trump e suas tarifas não produzem um só emprego no Brasil”, escreveu Gaspari. Ao associar-se ao presidente americano, lideranças bolsonaristas — entre elas o próprio Tarcísio — escorregaram na casca de banana de um discurso que não encontra eco no cotidiano do eleitor brasileiro.
As pesquisas reforçam esse diagnóstico. O último levantamento Genial/Quaest mostra Lula vencendo todos os cenários de segundo turno. O petista “saiu das cordas e voltou a ser o favorito”, observa Gaspari, apoiado por uma máquina política que, mesmo desgastada, mantém coesão e capilaridade nacional. O contraste é evidente: se a esquerda se une em torno de um nome e um projeto, a direita se fragmenta em personalismos e disputas de território.
Leia mais: Para Lula, Pacheco candidato é mais vantajoso do que no STF
Postulantes da direita
Governador de SP afirma que, entre os presidenciáveis, o mais viável é Ratinho Jr, do Paraná. Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil
Tarcísio, Ronaldo Caiado (União Brasil) e Romeu Zema (Novo), governadores que poderiam compor uma frente liberal, “não se entendem”. Eduardo Bolsonaro (PL) age como um “guerrilheiro avulso”, enquanto o ex-presidente Jair Bolsonaro, agora em prisão domiciliar, tornou-se um fator de desagregação, “uma espécie de encosto”, nas palavras do colunista. A força que em 2018 galvanizou o sentimento antipetista se esvaiu, e o bolsonarismo, longe de se reinventar, parece aprisionado em sua própria caricatura.
Nos bastidores, Tarcísio tenta articular uma transição suave de liderança. Defende Ratinho Júnior como alguém capaz de dialogar com o centro, com baixa rejeição e boa margem para crescer. Sua avaliação é pragmática: com um eleitorado menos radical e perfil mais administrativo, o paranaense poderia chegar ao segundo turno, mesmo com Eduardo Bolsonaro atraindo cerca de 15% dos votos. Ainda assim, a equação é frágil — e depende de um grau de concertação que a direita, hoje, não demonstra ter.
Além disso, a tentativa de projetar Ratinho Júnior soa mais como um gesto de fuga do que de confiança. Nos bastidores do Republicanos e do PSD, cresce a percepção de que Tarcísio teme o desgaste de um embate direto com Lula. A guerra interna entre bolsonaristas e liberais moderados, somada ao esvaziamento de lideranças como Sergio Moro, que Gaspari chama de “senador ectoplásmico”, reforça a sensação de que falta à oposição não apenas um nome, mas um rumo.
Enquanto isso, o governo Lula aproveita a desordem do outro lado. As iniciativas econômicas voltadas à classe média e aos trabalhadores de baixa renda, embora modestas, consolidam uma imagem de estabilidade e retomada. O Planalto ocupa o centro do debate, enquanto seus adversários ainda discutem quem poderá liderar a travessia de 2026.
Se há algo que define o momento, é o contraste entre disciplina e dispersão. A esquerda, unificada e estratégica, segue com Lula como polo de estabilidade. A direita, dividida entre o saudosismo bolsonarista e o cálculo pragmático de figuras como Tarcísio, parece andar em círculos. A pergunta que paira sobre o tabuleiro é simples, mas inquietante: haverá tempo — e fôlego — para que surja um candidato capaz de reorganizar esse campo antes que as urnas se abram?