A frase “o mundo não gira, ele capota” pode ser muito bem aplicada para a relação entre Trump e Lula. Se antes o presidente norte-americano não perdia oportunidade em ameaçar e aplicar sanções contra o Brasil, hoje faz ligações ao Chefe de Estado brasileiro, combina encontros e gera um ambiente político recheado de incertezas e desconfianças. Parece inacreditável, mas este foi o comentário do presidente norte-americano sobre o diálogo com Lula nesta segunda (6): “Teremos mais conversas e nos encontraremos em um futuro não muito distante, tanto no Brasil quanto nos Estados Unidos. Gostei muito da ligação. Nossos países vão se dar muito bem juntos”.
Diante disso, a situação mais que embaraçosa entre EUA e Brasil se estende, também, para os apoiadores do bolsonarismo que agarraram com unhas e dentes a defesa dos EUA, mesmo no momento em que o país aplicou o tarifaço contra mercadorias brasileiras.
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A gestão atual já sinalizou o enfraquecimento do movimento que apoia o ex-presidente, a começar pela decadência de Eduardo Bolsonaro e do influenciador Paulo Figueiredo. O ministro do Desenvolvimento Agrário, Paulo Teixeira, interpreta a relação de Trump com Lula como uma “pá de terra” na cabeça de Eduardo e de Figueiredo.
Ao O HOJE, o marqueteiro político Marcelo Senise explica qual deve ser o arranjo do bolsonarismo após a aproximação dos dois líderes americanos. Senise confirma a noção de que, por mais que Trump transpareça querer negociar com o Brasil, é válido pensar que o republicano prioriza usar, acima de tudo, estratégias de poder. “Trump é pragmático. Ele nunca foi ideológico, é movido por cálculo e poder. Lula entende isso e joga no mesmo tabuleiro, com a frieza de quem enxerga a geopolítica como teatro de interesses, não de crenças.”
O comunicador explica como o movimento de apoio ao ex-presidente Jair Bolsonaro se encontra diante da atual conjuntura política internacional entre os dois países. “Nesse cenário, o bolsonarismo se vê nu: sem causa, sem interlocução internacional e, sobretudo, sem relevância estratégica. A ligação de Trump para Lula é mais do que um gesto diplomático, é um terremoto simbólico. Ela desmonta a ficção emocional sobre a qual o bolsonarismo foi construído.”
Conciliação entre extremos
Já o comunicador Léo Pereira diz que a organização deve responder por graves crimes e que é necessário haver uma discussão mais aprofundada acerca das responsabilizações atribuídas ao bolsonarismo. “Eu penso que o bolsonarismo está condenado por graves crimes. O Brasil precisa avançar o debate. Espero que haja inteligência nos partidos, nas instituições e na sociedade. O cenário é de urgências e oportunidades únicas”, ressalta o marqueteiro político.
Marcelo Senise chama a atenção para o quanto as relações internacionais podem ser afetadas frente a aproximação entre um líder da direita norte-americana e um dos maiores estadistas da América Latina. O comunicador prevê que, na ausência de Trump, o que pode restar é a memória de tempos em que a mobilização popular era atiçada por discursos tais quais os proliferados pelo republicano.
“Quando o grande ícone global da direita populista estende a mão ao líder máximo da esquerda latino-americana, a retórica da guerra santa perde o sentido e o mito desaba. O que restar dele será pura nostalgia de um tempo em que o discurso do ódio parecia bastar para mobilizar massas.”
O marqueteiro político conclui sua análise ao mostrar o que realmente pode atingir, de forma profunda, o bolsonarismo. “Agora, até o ‘deus’ da direita global escolheu conversar com o ‘demônio’ da esquerda. E isso, para o bolsonarismo, é devastador. Mais do que um episódio diplomático, o diálogo entre Lula e Trump é o retrato do colapso das narrativas polarizadas.” (Especial para O HOJE)