Bruno Goulart
É como anunciar o fim de um casamento e continuar dividindo a mesma casa. União Brasil (UB) e Progressistas (PP) já oficializaram a saída do governo Lula e prometeram lançar candidato contra o petista em 2026. Mas ministros ligados às siglas seguem no comando de pastas importantes, como Turismo e Esportes. Esse paradoxo tem se arrastado e virou exemplo de como alianças políticas no Brasil nem sempre se sustentam pela lógica da coerência.
Para o cientista político da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Goiás (UFG) e professor Francisco Tavares, o episódio não mostra força, mas fragilidade do chamado presidencialismo de coalizão. “Este caso parece indicar antes a crise do presidencialismo de coalizão”, avalia. Tavares lembra que, mesmo quando União e PP estavam oficialmente no governo, o apoio parlamentar não veio. “Ao contrário, revelaram um comportamento oposicionista”, afirma. Agora, segundo o cientista político, a saída anunciada e a permanência de ministros apenas comprovam que “aquelas indicações se movem por vias distintas da composição de bases parlamentares estáveis”.
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Dentro da recém-criada Federação União Progressista, a ordem foi clara: todos os filiados devem deixar os cargos em até 30 dias. O deputado Zacharias Calil (UB) confirma a decisão. “Na reunião ficou decidido entregar os cargos com prazo de 30 dias”, disse. A medida atinge diretamente os ministros André Fufuca (PP), dos Esportes, e Celso Sabino (UB), do Turismo, ambos deputados licenciados.
O tom mais duro veio do deputado José Nelto (UB). Para o parlamentar, não dá para sustentar a contradição. “Não dá para continuar com essa bigamia. A decisão de convenção não se discute”, afirmou. E completou: “Ou eles tomarão a iniciativa, porque o que está em jogo não é apenas o CPF deles, é o CNPJ do partido”. Segundo Nelto, quem insistir em ficar no governo terá de sair da federação. “Não podem continuar casados querendo levar vida de solteiros”, comparou.
O caso de Celso Sabino é o mais delicado, que comunicou a Lula o desejo de ficar no governo. Parte do União Brasil reconhece que Sabino tenta ganhar tempo. O ministro é responsável pela organização da COP30, que será realizada em Belém (PA) em 2025, e também ocupa a presidência do Conselho Executivo da ONU Turismo, onde busca a reeleição. Internamente, há quem defenda que Sabino se desligue do partido para seguir no cargo para preservar a decisão da federação sem prejudicar o governo. Enquanto os dias passam, o governo só acumula elementos para, em 2026, durante a campanha, mostrar a incoerência do Centrão.
Defesa do governo
A pressão do outro lado também é forte. Lula tem cobrado mais empenho político de seus ministros. Em reunião no Palácio do Planalto, deixou claro que espera que eles defendam publicamente o governo em agendas pelo País. Ou seja, além de administrar suas pastas, precisam ser porta-vozes da gestão. Esse papel se torna impossível para quem pertence a partidos que já romperam com o Planalto.
A saída de União e PP, caso seja completa, representa perda significativa para o governo. Juntas, as legendas somam mais de 100 deputados e 15 senadores, um peso capaz de desequilibrar votações importantes no Congresso. Sem esse apoio, a aprovação de projetos estratégicos tende a ficar mais difícil.
O professor Francisco Tavares chama atenção para esse dilema. De um lado, partidos que formalmente se colocam na oposição. De outro, ministros que resistem em cargos estratégicos. Para Tavares, isso mostra que a lógica da distribuição de postos segue caminhos paralelos à formação de uma base parlamentar sólida. O resultado é um governo pressionado, partidos divididos e ministros acuados.
No fim, o paradoxo continua: União e PP comunicam o divórcio político com Lula, mas ministros seguem dentro do governo. Um pé na oposição, outro na situação. Como resumiu José Nelto, a federação não aceitará que “ministros continuem casados e levando vida de solteiros”. (Especial para O HOJE)
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