Um incêndio de grandes proporções atingiu o chamado Aterro Sanitário de Goiânia no último domingo (3), destruindo cerca de cinco hectares de vegetação. O fogo, de acordo com a Secretaria Municipal de Infraestrutura Urbana (Seinfra), teve início em uma área privada próxima ao aterro e acabou se alastrando, atingindo parte do terreno da unidade.
O Corpo de Bombeiros foi acionado e conseguiu conter as chamas, que não chegaram a atingir a área de operação do maciço, onde os resíduos são efetivamente depositados.
Apesar disso, o episódio gerou novo alerta sobre a precariedade da gestão de resíduos na Capital. Segundo a Companhia de Urbanização de Goiânia (Comurg), o incêndio foi extinto no mesmo dia e uma vistoria técnica descartou riscos ambientais ou sanitários à operação. “A área atingida não recebeu impactos diretos porque o lixo está aterrado e coberto com camada de terra, que atua como proteção”, informou a companhia em nota.
Ainda assim, a situação acendeu um alerta sobre as condições estruturais do local. Isso porque o aterro segue, na prática, classificado como lixão pela Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad), que em maio deste ano publicou um relatório contundente sobre a operação da unidade.
O relatório aponta ao menos 12 irregularidades graves no local, como a localização inadequada do aterro, ausência de todas as licenças ambientais obrigatórias e falhas nos sistemas de impermeabilização e drenagem. Além disso, o monitoramento ambiental é precário ou inexistente, há desvio no cumprimento do projeto aprovado, e a cobertura e disposição dos resíduos estão fora das normas.
O documento também destaca a falta de planos e equipamentos de emergência, manutenção e operação abaixo do exigido, relatórios ambientais incompletos, gestão deficiente de resíduos e do chorume (lixiviado), proliferação de vetores e pragas, além do risco real de deslizamentos e acidentes estruturais.
A gravidade das constatações reforça uma crise crônica. O Ministério Público de Goiás (MP-GO) afirma que o lixão opera de forma irregular desde 2011 e que a Prefeitura de Goiânia descumpre, há anos, um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) firmado justamente para reverter essa situação. Por causa deste descumprimento, o MP multou a Prefeitura de Goiânia em R$ 45 milhões.
“A Prefeitura segue depositando os resíduos sólidos urbanos em um local sem a estrutura mínima necessária, expondo a população e o meio ambiente a riscos contínuos”, alertou o órgão em manifestações recentes. Técnicos ouvidos pela reportagem apontam que, embora o incêndio não tenha provocado danos diretos à célula ativa do aterro, ele escancara a fragilidade do local, sobretudo diante de situações emergenciais.
Em nota oficial, a Seinfra esclareceu que o fogo não teve origem no aterro e que providenciou o registro de boletim de ocorrência para apurar as causas e eventuais responsáveis. “Equipes da prefeitura e do Corpo de Bombeiros agiram prontamente e o incêndio está totalmente controlado. O caso será devidamente investigado”, garantiu a pasta.
A Comurg também reforçou que o fogo não alcançou a célula operacional onde há deposição ativa de lixo e reiterou que o aterro segue em funcionamento normal. No entanto, ambientalistas e especialistas em gestão de resíduos afirmam que o incidente deve ser encarado como um alerta urgente.
“O que temos em Goiânia é um lixão disfarçado de aterro. A ausência de planejamento e de investimentos em saneamento básico e destinação correta do lixo traz riscos constantes, não só de incêndios, mas de contaminação do solo, do lençol freático e de doenças”, afirma um técnico ambiental que pediu anonimato.
Atualmente, o lixão de Goiânia recebe todo o resíduo domiciliar da Capital, sem licenciamento ambiental regularizado, sem controle efetivo de gases e do chorume e com falhas em quase todos os quesitos exigidos para operação segura. A cidade, que deveria ser exemplo de sustentabilidade, se vê no centro de uma crise sanitária e ambiental que se arrasta há mais de uma década.
Com a temporada de seca e queimadas, a situação se torna ainda mais crítica. Segundo o Corpo de Bombeiros, o combate ao fogo foi dificultado pela vegetação seca e pelo vento forte.
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