O Brasil ultrapassou, pela primeira vez na história, a marca de 70 milhões de inadimplentes, o que corresponde a cerca de 42% da população adulta. Os números refletem um cenário crítico para a economia nacional em 2025 e impactam diretamente setores como o mercado imobiliário, o varejo e os pequenos negócios, que enfrentam agora uma combinação de crédito restrito, juros elevados e consumo retraído.
O último levantamento mostra que 76,6 milhões de brasileiros estavam inadimplentes em abril, com dívidas em atraso há mais de 90 dias. O volume total das pendências soma cerca de R$ 457 bilhões, maior valor da série histórica iniciada em 2016. Entre os principais credores estão instituições financeiras, operadoras de cartão de crédito e prestadoras de serviços básicos como água, luz e gás.
Consumo comprometido e endividamento prolongado
Além disso, os brasileiros têm demorado mais para regularizar as dívidas. O percentual de famílias que admitem não ter condições de quitar os débitos voltou a subir, atingindo 12,4% em abril. A inadimplência prolongada é sintoma do aperto financeiro causado por inflação resistente, queda no poder de compra e juros elevados — que, em março, chegaram a 2,56% ao mês na média cobrada de pessoas físicas.
Mercado imobiliário sente os reflexos do não pagamento
Esse cenário afeta diretamente o setor imobiliário, especialmente o mercado de locações, que enfrenta um aumento preocupante na inadimplência dos inquilinos. Imobiliárias têm sido obrigadas a adotar uma gestão mais preventiva, investindo em análise criteriosa do perfil dos locatários e estruturação de contratos mais robustos. “Não se trata de desconfiança, mas de segurança jurídica e financeira. Levantar dados sobre a renda e o histórico financeiro do inquilino tornou-se uma prática essencial”, explica um especialista do setor imobiliário no Centro-Oeste, onde o avanço do endividamento chega a superar 70% em algumas cidades, segundo estimativas locais.
Em resposta à escalada da inadimplência nos aluguéis, o Poder Legislativo aprovou recentemente um projeto de lei que permite o despejo extrajudicial por falta de pagamento, por meio de cartório de notas, sem necessidade de ação judicial. A proposta representa um passo importante na “desjudicialização” das relações locatícias, mas levanta preocupações sobre possíveis abusos, sobretudo em situações de dúvida legítima sobre o valor da dívida. A regulamentação deverá garantir que o instrumento não seja utilizado como forma de coação ou ameaça à posse legítima.
Inadimplência nas locações força o setor imobiliário a adotar contratos mais rigorosos
Empresas sob pressão: crédito escasso e queda no faturamento
O problema também se espalha pelo ambiente empresarial, onde 7,3 milhões de empresas estão inadimplentes — equivalente a 32% dos CNPJs ativos no país. O montante devido chega a R$ 180 bilhões, com destaque para o setor de serviços, responsável por mais da metade das dívidas. A maioria esmagadora dos casos está entre micro e pequenas empresas, que somam 6,9 milhões de devedores, com cerca de R$ 146 bilhões em dívidas.
Empresas de menor porte são as mais expostas a oscilações do mercado e dependem fortemente do crédito bancário. Com margens estreitas e capital de giro limitado, muitas não resistem ao atual ambiente de juros altos e consumo retraído. No primeiro trimestre de 2025, o faturamento das pequenas e médias empresas caiu 1,2% em relação ao mesmo período do ano anterior. Indicadores de confiança também recuaram, refletindo a expectativa negativa quanto à recuperação da economia.
Inflação e juros altos mantêm o ambiente de risco
A inflação no atacado, que acumulou alta de 9,7% em 12 meses, pressiona os custos de produção, enquanto os preços ao consumidor avançam a um ritmo menor, de 4,6%. A defasagem tende a se converter em repasses futuros, mas a cautela dos consumidores, já endividados, limita o repasse total e encurta a margem de lucro de empresas que operam no varejo.
Em termos regionais, Amapá, Distrito Federal e Rio de Janeiro lideram em proporção de inadimplentes entre os consumidores, com taxas acima de 56% da população economicamente ativa. Entre as empresas, os estados com maiores índices de inadimplência empresarial são Alagoas (40,9%), Distrito Federal (40,4%) e Pará (39,4%).
Reação pontual não reverte tendência de alta
Apesar do cenário desafiador, dezembro de 2024 registrou uma leve retração na inadimplência, atribuída a um grande mutirão nacional de renegociação de dívidas. Foram firmados 10,7 milhões de acordos em menos de dois meses, o que possibilitou a retirada de 276 mil nomes dos cadastros de restrição ao crédito. Ainda assim, o impacto foi pontual e insuficiente para reverter a tendência de alta.
Estudos recentes indicam que a inadimplência de pessoas físicas com recursos livres pode chegar a 6,4% até julho, um alerta para o varejo e os setores que dependem do crédito ao consumidor. Já a taxa básica de juros, atualmente em 14,75% ao ano, deve permanecer nesse patamar até o final de 2025, mantendo o custo do dinheiro elevado e pressionando ainda mais o orçamento das famílias e das empresas.
Com perspectivas de recuperação lenta e crédito restrito, a inadimplência deve continuar sendo um dos maiores entraves ao crescimento econômico nos próximos meses. A busca por soluções como a simplificação legal, o fortalecimento da análise de crédito e a educação financeira será fundamental para reequilibrar o sistema e restaurar a confiança no mercado.
O post Inadimplência bate recorde e pressiona empresas, famílias e mercado imobiliário apareceu primeiro em O Hoje.